Spaghetti Paraiso. Nicky Persico

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Spaghetti Paraiso - Nicky Persico

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      Nicky Persico

      Spaghetti Paraiso

      Tradução de Aderito Francisco Huo

      Obra com a cobertura da copyright – todos direitos reservados – é proibida qualquer divulgação ou reprodução mesmo parcial sem a prévia autorização.

      Copyright © 2019 - Nicky Persico

      Explicaste sobre o inferno, aquele das mulheres que não têm voz,

      Que não sabem mais pedir ajuda.

      Porque não conseguem, porque não podem, porque não querem.

      Ou na verdade, porque isto é o que crêem.

      Mas o seu é apenas um sortilégio, um enfeitiçamento de morte. Morderam a maça errada, que parecia boa,

      E pelo contrário estava vazia, e podre. Podre por dentro.

      NÃO-TEMPO

      Escuro. Escuro como breu. Fim da tarde, quase noite. O tempo como parado.

      Fecho a porta do escritório. O último a sair, como acontece frequentemente. Nada de elevador, também desta vez. Enfio decidido uma estreita e empoeirada caixa da escada de cimento. Daquelas que conduzem, por habito, aos parques de estacionamento subterrâneos, com as faixas encarnadas e brancas nos cantos, as pontas apagadas, e o cheiro típico de humidade e de mofo.

      Depois do último bloco de degraus, passo uma porta de ferro aberta, com um arganéu antipânico (porta de segurança que abre por dentro). A área de estacionamento está semi-vazia, lúcida. Um néon, que mal funciona, ilumina a custo alguns escorços, criando amplas penumbras entre pilares e as tiras amarelas no pavimento.

      As rampas estão rotas e marcadas por manobras desajeitadas. Dois os carros parqueados. Dirigindo-me lá para o meu, logo atrás duma esquina vejo uma figura parada, há alguns metros. Fico congelado.

      Uma mulher alta. Casaco comprido, escuro, e um chapéu com a aba larga. Cabelos compridos e claros.

      Reconheço-a, embora está quase de costas. Tínhamo-nos avistado um pouco antes, no escritório. Depois tinha ido embora, alguns minutos antes de mim.

      Está parada. Com os braços esticados empunha com duas mãos uma pistola cromada apontando-a direitinho, com segurança, diante de si.

      Observo-a, e ao mesmo tempo observo tudo aquilo que tenho à minha volta, como se apenas o meu tempo estivesse a passar, enquanto todo o resto é um fotograma firme. Dou um outro passo, silencioso. Vejo melhor, agora. A arma que a mulher empunha com ambas as mãos está apontada sobre alguém, ainda menos visível, diante dela. Com dificuldade noto as suas feições: uma figura feminina com um casaco comprido escuro e chapéu. Cabelos compridos e claros.

      São parecidos!

      Também ela empunha uma pistola, apontada contra a sua gémea. Mas a empunha com uma única mão, e tem o corpo no sentido transversal, em relação ao seu alvo, como num duelo dos outros tempos.

      A cabeça virada, alinhada ao ombro direito, e o braço levantado. Posso intuir que observa na mira, como um atirador de precisão que mira um alvo do polígono.

      Três pontos alinhados: olho, mira, alvo.

      Duas mulheres, armadas, em posição de impasse.

      Certamente – é óbvio – uma defende-se da outra. Uma assassina, uma vítima, e depois eu: elemento inesperado, variável imprevista, complicação, ou sorte inesperada. Tudo depende daquilo que vai acontecer daqui em diante.

      Sozinho, e o que poderei fazer.

      De que maneira, e se, vou mover-me daqui.

      Posso permanecer petrificado pelo medo, ou imóvel pela escolha. Posso gritar, tenho o instinto, ou então atirar-me ao chão, ou fugir tentando de abrigar-me, ou dar um passo para com elas, ou recuar. Posso fazer algo, ou não fazer nada, e pode mudar tudo: vida, também, ou morte.

      Uma coisa, pois, é segura. Uma daquelas duas mulheres não está mais a defender apenas a sua vida: está a defender também a minha.

      Se a assassina continuará a levar a melhor sobre o seu alvo, depois vai-me matar: sou uma testemunha.

      Posso esperar, e rezar que aconteça o contrário. Ou posso agir.

      Mas como?

      Ninguém imagina de poder ver-se para decidir uma coisa tão importante em poucos minutos. E todavia pode suceder.

      Nem eu teria imaginado por acaso de poder encontrar-me numa situação do género.

      Não teria tão-pouco imaginado de poder ser juiz, ou árbitro, ou factor determinante, da vida de outras pessoas. As mesmas pessoas que, paradoxalmente, eram juiz e arbitro da minha.

      E ter que decidir numa situação de não-tempo o que fazer. Ou não fazer. Sabendo que podia fazer a diferença entre viver e morrer.

      O tempo não é sempre o mesmo.

      Existem anos que duram um instante, e instantes que não parecem simplesmente eternos: o são realmente. É isto, o não tempo.

      Ao meu lado, numa saliência da parede, uma forma compacta de metal, talvez uma tenaz do torno do banco, esquecida sei lá por quem. Apanhei-a mecanicamente, sem pensar.

      Pesa pelo menos um par de quilos. E está gélido.

      O instinto é o espaço dum instante que não existe. Não-tempo.

      Para muitos aconteceu, por exemplo depois dum incidente, de não ter alguma recordação consciente de como aconteceu. Para depois, pelo contrário, descobrir que tinha conseguido virar, travar, e esticar simultaneamente um braço protegendo alguém. Muitas vezes acções eficazes, correctas. Talvez as melhores decisões que se podiam tomar naquela circunstancia.

      No entanto, para rever os acontecimentos, não houvera interrupções, ou pausas, na sequência dos factos: algo inesperado e repentino tinha acontecido, e tinham agido por conseguinte.

      Mas em que momentos decidiram como agir? Quando, puderam reflectir sobre as acções que depois puseram em pratica? Quando efectuaram o processo de questionar-se qual seria a melhor coisa para fazer, ou para não fazer, entre as varias possibilidades, talvez seleccionando ou descartando alguma por via dos efeitos colaterais consequentes?

      A resposta deveria ser: nunca, porque não tiveram, materialmente, o tempo.

      No entanto há uma incongruência, porque – de facto – escolheram, e depois executado, gestos calculados e racionais. Nem casuais nem confusos.

      E como explicam-no, depois?

      «Agi por instinto», dirão.

      Mas aquilo que eles chamam instinto ocupou a razão por uma fracção de tempo que nunca existiu.

      Não-tempo.

      Que pelo contrario existiu,

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