Anuario iberoamericano de regulación. Varios autores
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Segundo as palavras da autora:
a autorização de serviço público (da mesma forma que a autorização de uso de bem público) é dada no interesse exclusivo do particular que a obtém; ele não exerce uma atividade que vá ser usufruída por terceiros, mas apenas por ele mesmo. Vale dizer que aquela mesma atividade que, na concessão e permissão, constitui serviço público no duplo aspecto da titularidade do Estado e de prestação ao público (no interesse geral), quando se trata de autorização perde essa segunda característica porque, embora continue de titularidade da União (como decorre do artigo 21, XI e XII, da Constituição), não é prestada ao público, no interesse geral, mas no interesse restrito do próprio beneficiário da autorização28.
Exatamente em função do fato de que a autorização seria emitida no interesse exclusivo do autorizatário há, segundo a visão da autora, a expressa reafirmação de seu caráter discricionário e precário. Dado que não há uma atividade de interesse coletivo ofertada, não haveria necessidade de proteção da posição subjetiva do particular, de forma que o Poder Público poderia revogar a o ato autorizativo a qualquer tempo, em nome de juízo de conveniência e oportunidade29.
O entendimento ora descrito de Celso Antônio Bandeira de Mello e de Maria Sylvia Zanella Di Pietro é frequentemente reproduzido por outros autores brasileiros, como é o caso de José dos Santos Carvalho Filho30 e Edmir Netto de Araújo31, entre outros.
Ou seja, por meio da proposição de hipóteses de cabimento, seguem os autores, em linhas gerais, o entendimento manifestado originalmente por Hely Lopes Meirelles, apenas transpondo as considerações desse para os casos específicos do artigo 21 da Constituição Federal. E essa transposição dá-se a partir das ideias de que as atividades arroladas no dispositivo mencionado somente podem ser exploradas por meio de autorização (i) em casos que satisfaçam apenas os interesses do autorizado ou (ii) em casos extremamente excepcionais de emergências públicas. Exatamente em função desse cabimento da autorização, mantém-se o ato como discricionário e precário.
Não obstante, esse entendimento parece-me completamente equivocado e demandante de urgente revisão doutrinária – a qual, aliás, já é obra em andamento há mais de uma década. Como passarei a expor, o entendimento em debate é completamente desprendido do direito positivo, subsistindo apenas em um mundo hermético e irreal de parte da doutrina brasileira. Para fundamentar essa afirmação, passarei a expor, do ponto de vista teórico, quais os contornos jurídicos do instituto da autorização à luz do artigo 21 da Constituição Federal, partindo-se (i) do que significa a intervenção estatal nele contemplada e (ii) quais os requisitos para a autorização diante do que implica a competência da União Federal ali estampada.
No que concerne ao primeiro ponto, é necessário perquirir o que determina o Texto Constitucional acerca das competências materiais da União Federal contempladas nos incisos XI e XII do artigo 21. A largada para tanto consiste em entender (i) o que é uma competência material e (ii) quais as consequências da existência de competências materiais em campos específicos da economia.
Uma competência material significa, de forma clara, uma capacidade jurídica atribuída à União Federal de realizar determinadas ações concretas nos campos discriminados no dispositivo em testa – e não apenas ações legislativas, portanto32. Mais ainda, o rol de atividades contemplado no artigo 21 da Constituição Federal cria um conjunto de funções públicas a serem empreendidas pela União Federal, ou seja, determinadas finalidades que devem ser desempenhadas para a realização dos interesses da coletividade.
Segundo o critério de apartação de competências pelo interesse predominante adotado pelo Texto Constitucional, cada ente federativo tem a atribuição de agir conforme o interesse existente diante do caso concreto. Nessa perspectiva, cabe à União Federal atuar sempre que houver um interesse de caráter nacional (artigos 21 e 22 da Constituição Federal), ao Estado sempre que houver um interesse de caráter regional (artigo 25 da Constituição Federal) e ao Município sempre que houver um interesse de caráter local (artigo 29 da Constituição Federal)33.
Contudo, a delimitação precisa desses interesses nem sempre é completamente clara, razão pela qual o Texto Constitucional vai além do simples estabelecimento de critérios para apartação de competências. Há uma sistemática na qual as competências atribuídas à União Federal são sempre determinadas de forma expressa e em rol fechado, ao passo que as competências municipais são as estritamente locais e as estaduais são as remanescentes.
Nesse passo, o que está contido no artigo 21 da Constituição Federal nada mais é do que uma lista de temas determinados constitucionalmente como de interesse nacional, que devem ser realizados pela União Federal para a concretização das finalidades constitucionais do Estado brasileiro.
Contudo, as competências materiais atribuídas à União Federal no artigo 21 da Constituição Federal são demasiadamente amplas e diversificadas, havendo algumas que, evidentemente, somente podem caber ao Estado (como, por exemplo, a impressão de moeda, nos termos do inciso VII do artigo 21) e outras que precisam de maior delimitação interpretativa para extração de seu preciso significado.
É precisamente o que ocorre em relação aos casos das atividades inseridas nos incisos XI e XII do artigo 21 em testa. Em referidos dispositivos há a previsão expressa da função pública federal de atuação em determinados setores da economia, como telecomunicações, energia elétrica e transportes aquaviários e aéreos. Ou seja, há a atribuição de um dever jurídico de atuação da União Federal nesses setores, a fim de alcançar determinadas finalidades públicas.
A partir dessa afirmação, uma primeira ideia que viria à cabeça é a de que os incisos XI e XII do artigo 21 da Constituição Federal contemplariam, necessariamente, uma relação de serviços públicos federais, ou seja, de atividades econômicas que devem ser exploradas pelo Estado para fins de realização de determinados direitos fundamentais. Esse entendimento é esposado por parcela da doutrina34.
Por mais sentido que possa fazer extrair dos incisos XI e XII do artigo 21 da Constituição Federal um rol obrigatório de serviços públicos, não é este entendimento, a meu ver, o mais correto. O estribo de meu entendimento reside exatamente no fato de que os incisos em discussão preveem que as atividades lá descritas podem ser exploradas diretamente ou por meio de concessão, permissão ou autorização.
A inserção da autorização como um dos instrumentos de translação das atividades mencionadas nos dispositivos em análise não é mera tertúlia acadêmica. É de enorme relevo para aferição do conteúdo de referidas atividades, pois, em consonância com o disposto no artigo 175 da Constituição Federal, os serviços públicos somente podem ser delegados a particulares por meio de concessão ou permissão35. Destarte, ao incluir a autorização no rol de instrumentos de delegação, deixa evidente o Texto Constitucional que nem tudo o que está ali disposto será serviço público36.
Exatamente nesse sentido, aliás, já decidiu o Supremo Tribunal Federal em relação à atividade de transporte aquaviário. Conforme se pode inferir do Recurso Extraordinário n.º. 220.999-7/PE37, a Corte Suprema rechaçou o entendimento de que a mera previsão do transporte aquaviário no rol do inciso XII do artigo 21 da Constituição Federal fosse suficiente para a transformação automática da atividade em serviço público.
Por outro lado, a previsão expressa das possibilidades