Batalha de amor - Uma dama para o cavaleiro. Margaret Moore
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Que lugar devia ter sido aquele, quando o conde e a sua esposa ainda eram vivos e ricos! Era fácil imaginar o luxo, os preparativos para as recepções, os inúmeros convidados, a música, os risos; também não era difícil visualizar uma filha mimada, alheia à trágica mudança prestes a ocorrer na sua vida. Mas isso não era da sua conta, reflectiu Etienne.
Tudo aquilo era tão diferente do casebre de taipa que fora o lar da sua infância, comandado por uma mãe amargurada e dominadora, e que tinha como única visita as lembranças do pai!
Nada disso tinha importância agora, contudo. Etienne superara as dificuldades do passado, e o conde morrera depauperado.
O barão recapitulou as outras coisas que o rei lhe contara: as tremendas baixas nos stocks, causadas pela generosidade desmedida do conde de Westborough para com quem quer que chegasse aos portões do castelo; a indiferença perante as actividades ilegais, principalmente a invasão de propriedade; as espantosas quantias de dinheiro que ele doava à igreja para a celebração de missas e orações. Não que tivesse restado muito para doar, depois da desastrosa safra do Outono anterior.
Etienne reparara no perfeito estado de conservação da maioria das habitações dos camponeses, enquanto cavalgava em direcção ao castelo. Ocorrera-lhe que, de certa forma, era injusto que o conde perdesse as suas terras, enquanto os arrendatários prosperavam a olhos vistos.
Etienne também ouvira histórias sobre o mimado e imprestável filho do conde, que deixara o país porque se considerara ofendido pelo pai. Talvez o jovem não estivesse a par da situação financeira, ou do precário estado de saúde do pai, mas devia ter tido a preocupação de avisar para onde ia, pelo menos à irmã ou a alguém de confiança no castelo. Por causa do egoísmo de Bryce Frechette, Gabriella encontrava-se em sérias dificuldades, e completamente sozinha. Apesar disso, ela não parecia condenar o comportamento infantil do irmão. Pouco antes, no pátio, mostrara-se contrafeita ao ouvir a verdade revelada abertamente, perante os arrendatários.
Etienne recostou-se na cadeira, pensativo, a observar os seus homens, que, obviamente, estavam a apreciar a esplendorosa refeição. Ele supunha que Gabriella Frechette diria, com a sua voz desafiadora e intrigante, que amava o irmão. Era uma lástima pensar que uma mulher com uma personalidade tão marcante se deixasse cegar pela emoção.
Mas o apuro de Gabriella Frechette pertencia ao passado. Àquela altura, ela já partira de certeza, e Etienne tomaria posse da sua décima propriedade, o número que ele estabelecera a si mesmo, anos antes, quando era pobre e passava fome e frio, no Inverno. Finalmente, a sua busca terminara.
Etienne DeGuerre permitiu-se outro sorriso, enquanto esticava o braço para pegar no cálice de vinho. Antes de o levar aos lábios, contudo, ele ficou imóvel por uma fracção de segundo. Gabriella Frechette acabara de sair da cozinha, trazendo uma travessa com carne, que começou a servir a um embevecido George de Gramercie.
Por todos os santos! Ele pensara que ela tivesse juntado as suas coisas e partido imediatamente após a humilhação em público. O que levava uma mulher a ficar, depois daquilo tudo?
Uma nova sensação invadiu Etienne, algo que há muitos anos ele não experimentava; de repente, sentiu-se envergonhado por ter tentado humilhar aquela mulher forte e corajosa. Seria possível que ela não tivesse consciência da sua verdadeira situação?
Ele percorreu os olhos pelo salão. Philippe de Varenne também observava Gabriella, com uma expressão de cobiça nos olhos de serpente e um sorriso cínico nos lábios finos. Até o normalmente jovial George olhava para ela com o semblante sério.
Felizmente, Donald Bouchard não representava perigo, mas até ele contemplava Gabriella Frechette como se um anjo do céu lhe estivesse a servir o jantar! O único que parecia indiferente à presença de Gabriella era Seldon, cuja atenção estava toda concentrada no prato à sua frente.
Etienne reparou no movimento gracioso e provocante dos quadris de Gabriella. Seria propositado, ou um simples dom da natureza? De qualquer modo, se ela permanecesse no castelo, causaria problemas.
Aquela situação não podia continuar, reflectiu Etienne. Gabriella precisava de se ir embora antes que os seus homens começassem a lutar por causa dela.
– Gabriella! – chamou ele, elevando ligeiramente a voz.
Gabriella aproximou-se, com uma expressão de indagação no olhar e um ligeiro rubor nas faces.
Etienne sabia que não podia voltar atrás, no seu ultimato. Seria um sinal de fraqueza, a que ele não se podia permitir.
Pensamentos indesejados invadiram-lhe a mente, ao contemplar Gabriella Frechette. Inesperadamente, visualizou-se a acariciar aquele corpo perfeito, a beijar-lhe os lábios rosados, a seduzi-la, transformando o ódio que ela sentia em ardente desejo...
Ele olhou de soslaio para Josephine, que limpava discretamente os lábios com um guardanapo. O que é que estava a acontecer? Estaria a ficar louco, a pensar em beijar uma pirralha como aquela quando tinha uma mulher como Josephine de Chaney à sua disposição? Que feitiço era aquele que uma nobre despojada da sua fortuna exercia sobre ele?
Gabriella parou e inclinou a cabeça, em expectativa. Etienne olhou para ela durante um momento; precisava de ter, e teria, absoluto controlo sobre aquela propriedade, sobre aquele castelo e, principalmente, sobre aquela mulher.
– Enche o meu cálice – ordenou.
Gabriella obedeceu, evitando olhar para o rosto atraente do barão, iluminado pelas inúmeras tochas apoiadas em castiçais, nas paredes. Apesar do apoio e do carinho que recebera dos servos, ela antecipara com apreensão o momento de se ver frente a frente com ele, outra vez. Aqueles olhos azuis intimidavam-na... O barão DeGuerre parecia uma estátua, não revelava os seus sentimentos. Não parecia humano. Era como se fosse um guerreiro sobrenatural enviado à Terra para mostrar aos outros que não passavam de frágeis seres da humanidade.
Ele permaneceu imóvel, enquanto ela se debruçava para encher o cálice, com as mãos trémulas. Não, não uma estátua, reflectiu Gabriella, inquieta. O barão parecia mais um gato, sentado à frente do buraco de um rato.
A presença daquele homem dominava o salão e a consciência de Gabriella. Ela procurou concentrar-se no que estava a fazer, ansiosa para se afastar dali. Finalmente, o barão moveu-se, recostando-se na cadeira de espaldar alto com um movimento graciosamente másculo. Gabriella deu um passo para trás, mas antes que se virasse, ele sorriu, com um ar de malícia e sedução, e murmurou:
– Vai para o meu quarto.
– Etienne! – exclamou Josephine de Chaney, incrédula. A suspeita e a dor transpareceram nos adoráveis olhos verdes, confirmando a Gabriella o que esta não queria aceitar.
– Como a condição de serva é nova para ti, desta vez vou repetir – disse o barão, ignorando a concubina. – Vai para o meu quarto.
Gabriella limitou-se a olhar para ele, chocada e horrorizada. Não podia ser... Ele não... seria capaz! Ela sentia-se como se tivesse sido despida diante de todos. Uma profunda vergonha invadiu-a, ao mesmo tempo que esperava, contra todas as probabilidades, que ele cancelasse a ordem. Ela podia ser uma serva, mas era uma mulher livre. Se o barão a possuísse à força, estaria a cometer um crime. E ela... faria... o quê? Quem a apoiaria contra o poderoso barão DeGuerre, o favorito do rei, o terror dos torneios, um homem que já lutara dez horas seguidas para