Polly!. Stephen Goldin

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Polly! - Stephen Goldin

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do que se tinha passado e ficasse pregado ao chão, sem conseguir reagir? Não, era melhor ir até lá e fazer uma surpresa ao irmão. Quem sabe, talvez a viagem o ajudasse a pôr alguma ordem nas suas próprias ideias. Atirou os poucos pertences que tinha para dentro do seu Toyota e começou a conduzir em direcção a nascente.

      Segundo Acto

      A viagem começou tranquilamente: sair da cidade para apanhar a auto-estrada era simples. O dia estava quente e o ar condicionado estava avariado, mas o sistema 4-90 - 4 janelas abertas a 90 km/h - ajudava a suportar o calor. O carro não tinha leitor de CD, mas a rádio estava a passar boa música, rock clássico. Ao menos isso. Enquanto ele se concentrasse no que estava a cantar, não pensava naquilo em que não queria pensar.

      Era de manhã e estava na hora de ponta. Ainda havia muito trânsito no sentido oposto, mas nenhum no dele: estava a conduzir no sentido contrário ao de toda a gente, para fora da cidade. Não havia nada que o obrigasse a abrandar. Mudou depois de auto-estrada, passando de quatro faixas para duas. O único trânsito que havia era ainda só no sentido oposto, o que significava que ele podia conduzir à vontade. Carregou no acelerador e o barulho do vento aumentou, abafando a música e levando-o a aumentar o volume do rádio.

      A estrada ainda seguia para nascente por cima das colinas e descia depois para o vale central da Califórnia, quente e abafado. Este era um sítio onde só os tolos - ou os desesperados - se aventuravam no Verão sem ar condicionado. Ele não sabia ao certo em qual das categorias se enquadrava.

      As colinas, que ele tinha deixado para trás, bloqueavam-lhe o sinal do rádio, que começou a falhar. Mesmo aumentando o volume se ouvia muito pouco, e era mais estática do que música; começou então a carregar no botão à procura de outra estação. Passou umas quantas à frente - desporto, um comentador qualquer claramente a tentar espicaçar os ouvintes - e uma estação onde estavam a falar em espanhol. Tentou mudar para FM, mas quase não havia recepção, por isso voltou para AM e acabou por encontrar uma estação que tocava música variada, de oldies a rock clássico. Não era má, embora fosse demasiado calma para o seu presente estado de espírito.

      A temperatura estava agora a aumentar rapidamente. O vento era tão quente quanto o ar dentro do carro, e ele começou a transpirar. Parou numa estação de serviço, atestou o depósito e comprou garrafas de água que, pensou ele, deviam ser suficientes para bastante tempo. A primeira bebeu-a em meia hora; e transpirou no mesmo espaço de tempo quase a mesma quantidade de água. Abriu a segunda garrafa e despejou parte dela na cabeça, o que o ajudou a reduzir a temperatura para os limites do razoável.

      Depois de sessenta quilómetros nisto, apanhou uma saída para uma auto-estrada com duas faixas de rodagem, quase vazia; tinha a estrada só para si. O relógio marcava dez e meia. Não estava a correr mal. Se continuasse assim talvez conseguisse até chegar ao rancho antes de escurecer - e de certeza que chegava antes de já estarem todos a dormir.

      A paisagem estava a mudar lentamente e os campos agrícolas bem cultivados estavam a dar lugar a uma zona árida, de mato e vegetação baixa. As montanhas no espelho retrovisor encolhiam à medida que ele se aproximava do centro do vale.

      Também esta estação de rádio estava a começar a falhar, agora com interferências de uma outra estação local, que orgulhosamente anunciava que tocava ambos os tipos de música, country e western. Na escala de preferências dele esses estavam só um ponto acima de rap, que por sua vez estava só um ponto acima de estática. Ouviu portanto com pouco interesse os acordes doloridos da música; mas depois de três cantores diferentes cantarem três canções de sofrimento sobre a mulher que os deixou, ele desligou o rádio, irritado, e continuou a conduzir em silêncio.

      Percebeu rapidamente que tinha sido um erro. Nos vinte quilómetros seguintes o pensamento dele ganhou asas e voou para longe. O IRS. Barbara. O incêndio. A loja. Barbara. Impostos. Fogo. Até música country era melhor do que isto.

      A temperatura continuou a subir. Ele bebeu o resto da água da segunda garrafa e voltou a despejar uma parte da terceira garrafa na cabeça, mas desta vez não resultou tão bem. Pelo menos ele tinha estofos de tecido em vez daquela imitação barata de couro: conduzir com a pele a colar-se naquele material a ferver teria sido muito pior, e a viagem já estava a ser suficientemente desconfortável.

      Olhou para o assento do lado: a pilha de papéis do seguro seguia lá viagem, com um dos sacos de roupa a servir de pisa-papéis. Ele tinha dado uma vista de olhos aos formulários quando o agente de seguros lhos tinha entregado, e eles queriam toda a espécie de informação, provavelmente até o nome de solteiro do pai e o signo do avô. Tinha havido um incêndio, pelo amor de Deus! A maior parte dos seus documentos tinha perecido. Como é que eles esperavam que ele lhes pudesse dar informação sobre as finanças do negócio se toda a informação tinha ardido?

      Não. Esta não era a altura certa para pensar nisso. Era altura de ouvir má música country e meditar enquanto conduzia pelo deserto.

      O ponteiro do velocímetro passou os cento e trinta quilómetros por hora. Sem trânsito na estrada, não havia nada que o impedisse de acelerar; e era pouco provável que a polícia se interessasse por ele numa auto-estrada deserta.

      Nesse preciso momento, viu outro carro a dar-lhe sinal de luzes. Encostou, a vociferar. Já conhecia o procedimento: pegou nos documentos do carro e na carta de condução e entregou-as ao agente da polícia, que lhos devolveu juntamente com uma multa, tudo de forma muito civilizada; quinze minutos depois já estavam ambos de volta à estrada.

      A temperatura estava agora a subir mesmo a sério. Ele despejou o resto da terceira garrafa de água na cabeça e quase que a sentiu evaporar-se ao tocar-lhe na pele. Bebeu depois a quarta garrafa de um só trago, o que não ajudou grande coisa. Parou então numa pequena bomba de gasolina que anunciava ser a única nos próximos cem quilómetros e atestou de novo o depósito. A gasolina era caríssima e ele estava a ficar sem dinheiro, mas com o azar com que andava nestes dias, era melhor não arriscar a alternativa.

      Uns minutos depois começou a perder o sinal da estação de rádio country, e começou desesperadamente à procura de outra, mas a única coisa que conseguiu encontrar ali, no meio do nada, foi uma estação religiosa. Porque diabo estava uma estação destas a transmitir a meio de um dia de semana? Nem sequer era domingo. Não era suposto estas rádios limitarem-se a transmitir pela noite dentro, quando não havia perigo de incomodar gente decente?

      "Estes eeee-volucionistas heréticos querem convencer-vos de que foi tudo um acidente", dizia o pregador. "Se encontrasses um relógio no meio de um campo, dizias 'que estranho, todas estas peças de metal se juntaram por acaso no meio de um campo de maneira a poderem marcar o tempo'? Que conclusão tão estúpida, ridícula, sem sentido, asinina, bronca, tola, palerma! Ou ias achar que alguém tinha construído esse mecanismo complexo com um objectivo em vista? Um relógio vem de um relojoeiro, tão certo como a noite segue o dia!"

      "Pois", disse ele irritado na direcção ao rádio, "um relojoeiro imbecil que, ou não sabe, ou não quer saber se deixa um relógio no meio de um campo estúpido qualquer. Se calhar foi o dono que o perdeu ou o deitou fora porque não funcionava em condições. Então e se deixasses uma barra de ferro no tal campo e voltasses uns meses depois e a encontrasses coberta de um pó vermelho? Achavas que alguém a tinha

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