CODIGO DA INSOLVENCIA E DA RECUPERACAO DE EMPRESAS (Portugal). Portugal
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A qualificação da insolvência como culposa implica sérias consequências para as pessoas afectadas que podem ir da inabilitação por um período determinado, a inibição temporária para o exercício do comércio, bem como para a ocupação de determinados cargos, a perda de quaisquer créditos sobre a insolvência e a condenação a restituir os bens ou direitos já recebidos em pagamento desses créditos.
41 – A finalidade precípua do processo de insolvência – o pagamento, na maior medida possível, dos credores da insolvência – poderia ser facilmente frustrada através da prática pelo devedor, anteriormente ao processo ou no decurso deste, de actos de dissipação da garantia comum dos credores: o património do devedor ou, uma vez declarada a insolvência, a massa insolvente. Importa, portanto, apreender para a massa insolvente não só aqueles bens que se mantenham ainda na titularidade do insolvente, como aqueles que nela se manteriam caso não houvessem sido por ele praticados ou omitidos aqueles actos, que se mostram prejudiciais para a massa.
A possibilidade de perseguir esses actos e obter a reintegração dos bens e valores em causa na massa insolvente é significativamente reforçada no presente diploma.
No actual sistema, prevê-se a possibilidade de resolução de um conjunto restrito de actos, e a perseguição dos demais nos termos apenas da impugnação pauliana, tão frequentemente ineficaz, ainda que se presuma a má fé do terceiro quanto a alguns deles. No novo Código, o recurso dos credores à impugnação pauliana é impedida, sempre que o administrador entenda resolver o acto em benefício da massa. Prevê-se a reconstituição do património do devedor (a massa insolvente) por meio de um instituto específico – a ‘resolução em benefício da massa insolvente’ —, que permite, de forma expedita e eficaz, a destruição de actos prejudiciais a esse património.
42 – Independentemente dos aspectos do actual regime que já se mostravam carecidos de reformulação, alguns acontecimentos recentes alertaram de forma particularmente expressiva para a necessidade de mais eficazmente assegurar o recto desempenho das funções cometidas ao administrador da insolvência.
O presente diploma introduz algumas garantias de melhor desempenho da função de administrador da insolvência, como a possibilidade de eleição do administrador da insolvência pela assembleia de credores e a previsão do decurso do prazo de um ano sem que esteja encerrado o processo como justa causa de destituição do administrador.
43 – O encerramento do processo, matéria deficientemente regulada no CPEREF, é objecto de tratamento sistemático no novo Código, que prevê com rigor tanto as suas causas como os respectivos efeitos.
44 – A sujeição ao processo de insolvência de pessoas singulares e colectivas, tanto titulares de empresas como alheias a qualquer actividade empresarial, não é feita sem a previsão de regimes e institutos diferenciados para cada categoria de entidades, que permitam o melhor tratamento normativo das respectivas situações de insolvência. Conforme atrás referido a propósito do plano de insolvência, este será tendencialmente usado por empresas de maior dimensão.
No tratamento dispensado às pessoas singulares, destacam-se os regimes da exoneração do passivo restante e do plano de pagamentos.
45 – O Código conjuga de forma inovadora o princípio fundamental do ressarcimento dos credores com a atribuição aos devedores singulares insolventes da possibilidade de se libertarem de algumas das suas dívidas, e assim lhes permitir a sua reabilitação económica. O princípio do fresh start para as pessoas singulares de boa fé incorridas em situação de insolvência, tão difundido nos Estados Unidos, e recentemente incorporado na legislação alemã da insolvência, é agora também acolhido entre nós, através do regime da ‘exoneração do passivo restante’.
O princípio geral nesta matéria é o de poder ser concedida ao devedor pessoa singular a exoneração dos créditos sobre a insolvência que não forem integralmente pagos no processo de insolvência ou nos cinco anos posteriores ao encerramento deste.
A efectiva obtenção de tal benefício supõe, portanto, que, após a sujeição a processo de insolvência, o devedor permaneça por um período de cinco anos – designado período da cessão – ainda adstrito ao pagamento dos créditos da insolvência que não hajam sido integralmente satisfeitos. Durante esse período, ele assume, entre várias outras obrigações, a de ceder o seu rendimento disponível (tal como definido no Código) a um fiduciário (entidade designada pelo tribunal de entre as inscritas na lista oficial de administradores da insolvência), que afectará os montantes recebidos ao pagamento dos credores. No termo desse período, tendo o devedor cumprido, para com os credores, todos os deveres que sobre ele impendiam, é proferido despacho de exoneração, que liberta o devedor das eventuais dívidas ainda pendentes de pagamento.
A ponderação dos requisitos exigidos ao devedor e da conduta recta que ele teve necessariamente de adoptar justificará, então, que lhe seja concedido o benefício da exoneração, permitindo a sua reintegração plena na vida económica.
Esclareça-se que a aplicação deste regime é independente da de outros procedimentos extrajudiciais ou afins destinados ao tratamento do sobreendividamento de pessoas singulares, designadamente daqueles que relevem da legislação especial relativa a consumidores.
46 – Permite-se às pessoas singulares, não empresários ou titulares de pequenas empresas, a apresentação, com a petição inicial do processo de insolvência ou em alternativa à contestação, de um plano de pagamentos aos credores.
O incidente do plano abre caminho para que as pessoas que podem dele beneficiar sejam poupadas a toda a tramitação do processo de insolvência (com apreensão de bens, liquidação, etc.), evitem quaisquer prejuízos para o seu bom nome ou reputação e se subtraiam às consequências associadas à qualificação da insolvência como culposa.
Admite-se a possibilidade de o juiz substituir, em certos casos, a rejeição do plano por parte de um credor por uma aprovação, superando-se uma fonte de frequentes frustrações de procedimentos extrajudiciais de conciliação, que é a da necessidade do acordo de todos os credores.
47 – É regulada de modo inteiramente inovador a insolvência de pessoas casadas, em regime de bens que não seja o de separação. É permitida a coligação activa e passiva dos cônjuges no processo de insolvência. Apresentando-se ambos à insolvência, ou correndo contra ambos o processo instaurado por terceiro, a apreciação da situação de insolvência de ambos os cônjuges consta da mesma sentença, e deve ser formulada conjuntamente por eles uma eventual proposta de plano de pagamentos.
48 – A presente reforma teve também por objectivo proceder à harmonização do direito nacional da falência com o Regulamento (CE) n.º 1346/2000, de 29 de Maio, relativo às insolvências transfronteiriças, e com algumas directivas comunitárias relevantes em matéria de insolvência.
Estabelece-se ainda um conjunto de regras de direito internacional privado, destinadas a dirimir conflitos de leis no que respeita a matérias conexas com a insolvência.
49 – Mantêm-se, no essencial, os regimes existentes no CPEREF quanto à isenção de emolumentos e benefícios fiscais, bem como à indiciação de infracção penal.
50 – Para além da aprovação do CIRE, o presente diploma procede ainda à alteração de outros diplomas já vigentes, passando-se a enumerar as mudanças fundamentais, já que outras decorrem de mera adaptação à terminologia adoptada naquele novo Código.
Por efeito da alteração ao regime