Spaghetti Paraiso. Nicky Persico

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Spaghetti Paraiso - Nicky Persico

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algumas vezes não é química, é magia: cumplicidade, frescura, curiosidade, transgressão e novidade.

      A um passo do paraíso. E a dois períodos da universidade. De seguida, depois de irregulares entregas ao estudo, a licenciatura foi alcançada, e veio a pratica forense.

      Um período de substancial estágio junto dum ou mais escritórios de advocacia, durante o qual o futuro advogado deve experimentar, experimentar-se, e capitalizar em termos práticos a bagagem teórica acumulada no percurso estudantil.

      Em suma um percurso formativo, para muitos, que na realidade, através dalguns, vinha definido a clássica experiencia a noventa graus.

      Não para todos – como posso dizer – vinha fornecida a real possibilidade de aprender. Eu, do meu canto, tive certamente o modo de perceber um monte de coisas.

      Muitos sustentam que na vida é importante ter dois valores. Uma vez reparei uma furgoneta blindada, com seguranças armados e com uma escrita TRANSPORTE DE VALORES. A ética não tinha por acaso parecido tão preciosa.

      Cerrati alcançou-me sem fôlego. Estava trajado como sempre, um cruzamento entre um burocrata e um realizador da transvanguarda francesa.

      Tinha uma pasta a tiracolo, de pele, enfim completamente deformada e desgrenhada, transbordante de correspondências sei lá de que origem, e de braço dado com umas folhas, misturadas com paginas de jornal únicos e varias correspondências cheia de envelopes. Tudo meio fechado num semanário que teria deixado a satisfação sei lá de quantos coleccionadores.

      «Advogado, meu deus, desculpe o atraso, mas parquear no centro da cidade é sempre muito difícil, e pensar que no momento em que procurava um lugar aconteceu-me uma coisa… olha… uma coisa terrível… uma senhora… precisamente no momento em que eu tinha visto o parque de estacionamento… considerando que eu sou sempre prudente… aquela chegava disparada, advogado, e digo disparada… está claro que se corre sempre… mas a uma velocidade de loucos… digo eu… existem crianças… sei lá…»

      O Cerrati de sempre.

      «Cerrati, desculpe-me», interrompi-o.

      «Não advogado, por caridade… desculpe-me senhor… ou melhor… eu…»

      «Está bem, Cerrati. Percebi o que tenciona. São coisas que acontecem. A propósito, trouxeste os documentos?»

      «Sim, advogado! … sim… eis aqui: organizei-os, como recomendou o senhor!»

      Ao pronunciar estas palavras, entregou-me a correspondência que tinha observado um pouco antes. O conceito de «ordem», do ponto de vista de Cerrati, era a demonstração científica da eficácia do termo «relativo». Sim. O monte informe de papel amarrotado era para mim. Hesitava instintivamente, em levá-lo, e Cerrati esticou as mãos um pouco ainda. Encorajou-me.

      «Obrigado, Cerrati: naturalmente hei-de observá-los apenas possível.»

      Minha senhora, mas certamente… sim… eu pensava… talvez o senhor, com muitas ocupações importantes… eu antes tenho que lhe agradecer…»

      Todas as tarefas importantes… e porque não…

      «Combinado. Então vou, porque infelizmente, sabe, tenho um outro compromisso, e não posso atrasar.»

      «Ah! Mas olha, advogado, que se tem justamente um tempinho lhe explico… em linhas gerais…»

      «Obrigado, Cerrati, mas prefiro falar com conhecimento da causa: logo que terminar lhe comunico eu…»

      Àquelas palavras, Cerrati contra a vontade distanciou-se, reparando-me a desvanecer-se a ocasião de manter-me ali pelo menos uma boa hora para ilustrar-me «sinteticamente» o assunto. Eu, pelo contrário, às 16:45 hora local já estava de regresso: tinha um compromisso.

      Tinha apenas fechado a porta às minhas costas, quando o fax ao lado de Fanny, depois dum toque delicado, começou a gralhar e a emitir lentamente, através daquele orifício tecnológico que certa vez parece a evolução da «boca da verdade», uma escrita proveniente da chancelaria do tribunal. O sorriso malicioso começou a degradar-se lentamente, a partir do rosto da inveterada secretaria, na medida directamente proporcional às linhas legíveis na medida em que apareciam. Quando o documento foi completamente emitido, já o tinha lido todo, e observando-o no rosto podia-se pensar que naquelas escritas tinha sido anunciado o fim do mundo.

      Sem dizer uma palavra, recolheu as duas folhas, e com um passo incerto dirigiu-se em direcção da sala do advogado, entrando e reaparecendo na entrada poucos segundos depois. Tomou de novo o seu lugar e continuou a manobrar o pc como se nada tivesse acontecido.

      Mas pelo ar percebia-se um estranho silêncio. Mais que outra coisa era como se uma espécie de «buraco negro» sonoro que absorvesse qualquer outra coisa mesmo fisiológico rumor de todo o escritório.

      A atmosfera tornou-se imaginário.

      Esther, a jovem advogada, sobrinha do advogado Spanna, que ocupava o primeiro gabinete à esquerda, como obedecendo a um silencioso apelo espreitou furtivamente: aproximou-se a fanny e pronunciou apenas quatro palavras.

      «Não me digas que…»

      Fanny reparou-a um instante, e não respondeu.

      Esther levou a mão à boca e refugiou-se com toda pressa fechando a porta às costas.

      Às vezes os acontecimentos da vida cruzam-se de forma imperscrutavelmente complicada, «baralham-se», enfim.

      O processo de perturbação é democrático. E as vezes diabólico. A bola da roulette, naquela tarde, tinha parado na casa do advogado Spanna.

      Todos advogados, por definição, no papel de defensores «vencem» ou «perdem» contenciosos. É estatisticamente impossível que isto não aconteça em percentagem mais ou menos variável. Assim como não é pensável imaginar que um advogado não leva em conta – sempre – a possibilidade que a parte assistida (como é frequentemente por eles definido o cliente), não obstante prognósticos favoráveis, sucumba.

      É lógico, pois, esperar uma certa frescura, quando isto acontece.

      E de facto o advogado Spanna não pestanejou depois de ter enforcado os óculos e lido impassível a disposição do juiz civil que via a sua cliente arrojadamente perdedor num processo de separação.

      Aquela cena evocava assoladamente uma canção de Jannacci, que mais ou menos recitava: «… aqueles que… quando perde o Inter… ou Milan… dizem "no fundo é apenas um jogo de futebol" e depois voltou para casa e batem nos filhos… (ooohhh yeeeah)»

      O advogado pousou as folhas, pegou o celular, e saiu do escritório como se nada fosse, passando diante de mim e dizendo apenas, de meia voz: «volto daqui a nada».

      Não se deu conta, naturalmente, da presença de Mutolo, imóvel e perfeitamente camuflado com a tapeçaria do corredor.

      MUTOLO

      Mutolo estava acima dos setenta. Era magro, esbelto, e o conheci nos corredores da universidade, um pouco antes de licenciar-me.

      O tinha visto muitas vezes seguir algumas aulas, nas tardes frias, e me questionava quem seria. Tinha pensado que quisesse licenciar-se. Muitos

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