O Cidadão Anulado E Outras Histórias. Foraine Amukoyo Gift
Чтение книги онлайн.
Читать онлайн книгу O Cidadão Anulado E Outras Histórias - Foraine Amukoyo Gift страница 2
Não conseguiria presenciar a morte da Mira. Saí do quarto, pensando se a minha decisão final tinha sido correta. Fora insuportável vê-la sofrer dia e noite. Sua dor no abdômen, constantes enjoos e vômitos deixaram um peso doloroso no meu coração. O câncer havia perfurado o seu intestino. Ela era alimentada por meio de sondas e evacuava na cama. Às vezes, quando tinha vômito fecal, os resíduos chegavam à sua boca, nariz e ânus ao mesmo tempo.
A doença de Mira irritava algumas enfermeiras. Hesitavam em atender os chamados do seu quarto. Uma vez, escutara uma das enfermeiras fofocar que eu havia perdido a noção das coisas.
- Ele está absorvendo a doença dela. Como pode uma pessoa respirar confortavelmente nesse corpo fedido?
Mira era o meu anjo da guarda. Ela me acolheu depois de eu perder os meus pais aos 15 anos, mortos durante um protesto contra salários atrasados e suspensos. De acordo com o relatório policial, balas perdidas os haviam matado. Eles eram a espinha dorsal do protesto de solidariedade à causa em Lagos. Por acaso, ouvi Mira dizer a um colega que eles foram vítimas de uma conspiração.
Meus pais morreram como médicos pobres. O juramento proferido, pessoal e profissional, foi o de salvar vidas. Pagavam contas de estranhos no hospital. Após o enterro deles, nenhum parente quis a minha guarda. Sabiam que o hospital particular da minha família estava falido. Mira me adotou. Era a enfermeira-chefe da instituição.
Eu estava exausto. Fechei os olhos. Minha cabeça doía. Ouvir a confirmação da morte de Mira seria como receber um soco. Sequer escutei os passos vindos na minha direção, até sentir mãos me tocando.
- Tejiri, ganhamos. O juiz concedeu permissão para você levar Mira para casa até que ela... se vá.
A novidade de Kome, meu advogado, me trouxe alegria. Chorei e o abracei com força. Corri na direção da enfermaria de Mira. Gritei para o médico parar o procedimento.
Eu estava ofegante ao chegar. - Pare, doutor, o seu hospital perdeu. O senhor e toda a equipe perderam. Eu ganhei a ação para levar Mira pra casa. Ela vai comigo.
Meu advogado adiantou-se com a ordem judicial: - Por favor, autorize a saída da paciente para o meu cliente. Daqui por diante ele é o responsável.
Sorri, radiante de alegria, ao ouvir a afirmação. - Sim, devolva a minha Mira. Todos devem ter dito a ela coisas horríveis para que odiasse a si própria e procurasse a morte como solução.
Toquei a bochecha de Mira.
Ela sorriu debilmente. - Você é um tolo. Ah, Tejiri, isso foi uma bobagem. O fedor será insuportável na sua casa. Depois da minha partida, o apartamento irá cheirar mal ainda por um bom tempo.
- Sim, Mira, é esse o meu desejo. Quero manter o seu cheiro; para sempre.
As enfermeiras não gostaram de limpar Mira nem pela última vez.
- Escute, enfermeiras, eu sei que nenhuma das senhoras quer fazer isso. Mas mudem essas caras carrancudas, façam isso sorrindo. Ela está saindo do hospital para sempre. Vou levá-la para uma ilha. Seremos apenas nós dois no paraíso.
- Mal posso esperar para ver esse paraíso - disse Mira.
- É apenas uma casinha bonita, numa ilha em Epe. Ah, Mira, você vai adorar.
* * * * * *
Estávamos na varanda. O sol da manhã nos banhava. Era como um bálsamo de cura. Havia feito muito frio na noite anterior. O calor moderado confortava a minha pele. Mira se sentia em casa. Ela estava em uma maca. Apoiei suas costas e braços em alguns travesseiros.
- Tejiri, você é o melhor cuidador do mundo. Prometo que não o incomodo.
Ela estava frágil. A maior parte de seus cabelos havia caído e os seus olhos tinham as cores de um rio sombrio e triste. Eu não conseguia enxergar a alegria que seu rosto costumava irradiar. Abri uma barra de chocolate e mordi um pedaço.
- Tejiri, por favor, me dê um pedacinho.
- Mira, e a diabetes? Isso tem açúcar.
Ela zombou: - Tejiri, Tejiri, pode um corpo morto morrer mais?
- De jeito nenhum, desculpe. Tome, pode comer esse e o resto que está na geladeira.
Abri um pouco mais a embalagem e dei para Mira. Ela comeu o chocolate macio com satisfação. Sorriu, saboreando e deu outra mordida.
- Mira, está na hora de tomar banho.
- Tejiri, me deixe ficar um pouco aqui. Estou adorando - Mira se aninhou ainda mais na cama macia.
- Sabia que você adoraria esse lugar. Eu sempre falei em construir uma ilha particular pra lhe dar de presente, lembra? Perdão por ter sido tão tarde.
Mira suspirou profundamente. - Tejiri, você fez bastante. Tenho tanto orgulho... Você agora é um bem-sucedido engenheiro de Petróleo. Um brinde à prosperidade! - e me deu um pequeno pedaço de chocolate.
Peguei e comi. Olhei para as águas calmas da ilha. Uma rajada de vento fresco soprou em meu rosto e pensei: “essa prosperidade nada significa sem você para desfrutá-la”.
- Vá, pegue aqueles chocolates. Quero comer todas as barras que houver na geladeira.
- Está bem, Mira, vou pegar os chocolates.
- Eu amo você, Tejiri.
- Mira, sabe o quanto eu a amo. - Dei um beijinho na sua testa.
Fui ao banheiro e, enquanto urinava, uma brisa fria roçou as minhas pernas. Tive um calafrio repentino e pensei de onde poderia vir, porque a temperatura do banheiro estava cálida. Olhei a porta e a janela fechadas; fiquei meio sem entender. Sacudi minha cabeça, dei descarga e lavei as minhas mãos.
Levei um tempo para abrir todos os chocolates, colocá-los numa bandeja e cobri-los com um pano. A caminho de Mira, tropecei e gritei. Machuquei o dedão, mas ignorei a dor e corri para a varanda.
Mira estava confortavelmente relaxada. Tinha colocado um travesseiro sob os pés. Seus lábios estavam lambuzados de chocolate. Sorri, coloquei a bandeja sobre a mesa e me ajoelhei em frente a ela.
- Mira, olhe só quantos chocolates. Você vai fazer uma festa!
Mira estava em silêncio e imóvel. Peguei sua mão: o corpo estava quase frio. Seus olhos permaneciam abertos. Fechei suas pálpebras e chorei. Mira não esperou para se despedir de mim...
Lágrimas rolaram pela minha face por muitos dias.
Dois
Histórias da Aldeia
Jessa nasceu