Romancistas Essenciais - Joaquim Manuel de Macedo. Joaquim Manuel de Macedo
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Читать онлайн книгу Romancistas Essenciais - Joaquim Manuel de Macedo - Joaquim Manuel de Macedo страница 32
Ela não podia encontrar o escrito.
— Sr. Augusto, disse então, toda vergonha e acanhamento, eu lhe rogo que me dê esse papel.
— Pois não quereis ouvir mais nada!...
— Basta o que tenho ouvido e que não posso bem compreender; mas dê-me o que lhe pedi.
— Daqui a pouco, senhora, na hora de minha partida para a corte, porém com uma condição.
— Pode dizê-la.
— Sois sobremaneira delicada, senhora; este excesso vos deve ser nocivo; quereis fazer-me o obséquio de ir descansar e dar-me a honra de aceitar a minha mão até à porta da gruta?...
— Com muito prazer.
Então os dois se dirigiram para fora; passando junto das três companheiras, d. Gabriela pôde apenas dizer-lhes:
— Até logo.
Chegando à porta, Augusto falou já em outro tom:
— Minha senhora, espero que me faça a justiça de crer que fico extremamente penalizado por não poder dilatar por mais tempo a glória de acompanhá-la; mas sabe o que ainda tenho de fazer.
— Obrigada, respondeu d. Gabriela, não poupe as outras.
Não é possível bem descrever a admiração das três.
Augusto chegou-se a d. Quinquina, e tomando-lhe a mão disse:
— Minha senhora, é chegada a vossa vez.
D. Quinquina deixou-se levar para junto da fonte; as moças tinham perdido toda a força; o que diante delas se passava pedia uma explicação que não estava ao seu alcance dar. Augusto começou:
— Senhora, eu poderia dizer-vos, pelo que me conta a boa fada, que vós sois como as outras de vossa idade, tão volúveis como eu; mas para tal saber não precisava eu beber da água encantada; podia também gastar meia hora em falar do vosso galanteio com um tenente da Guarda Nacional, por nome Gusmão...
— Senhor!...
— Por nome Gusmão, que leva o seu despotismo amoroso a ponto de exigir que não valseis, que não tomeis sorvetes, que não deis dominus tetum quando ao pé de vós espirrar algum moço e que não vos riais quando ele estiver sério,
— Quem lhe disse isto, senhor?...
— A fada, senhora; e ainda me disse mais: por exemplo, contou-me que no baile desta noite, passeando com um velho militar, vós recebestes da mão dele um lindo cravo e a seus olhos o escondestes, com gesto apaixonado, no palpitante seio; mas daí a um quarto de hora essa mesma flor, tão ternamente aceita, deveria ir parar ao bolso de um belo jovem, chamado Lúcio, se acaso não fosse roubada pela fada que preside esta fonte.
— Eu não entendo nada do que o senhor está dizendo... isso não é comigo.
— Eu me explico: o sr. Lúcio viu ser dado e recebido o presente, e fingindo-se zeloso, vos pediu esse cravo, muito notável porque, além da flor aberta, havia sete flores em botão. Ora, dizei, não é verdade? Pois o sr. Lúcio queria esse cravo, mas vós não lho podíeis dar, porque o velho militar não tirava os olhos de vós; ora, conversando com o sr. Lúcio, acordastes ambos que ele iria esperar um instante no jardim e que um pequeno escravo, por nome Tobias, lhe levaria a flor; e como o tal Tobias ainda não conhecia o sr. Lúcio, este lhe daria por senha as seguintes palavras — sete botões — não foi assim?
D. Quinquina guardou silêncio, porque tudo era verdade; ela estava cor de nácar. Augusto prosseguiu:
— Isto se passou estando vós na grande varanda, sentados em um banco e com as costas voltadas para uma janela da sala do jogo; ora, a fada esteve recostada a essa janela, ouviu quanto dissestes e como lhe é dado tomar todas as figuras, tomou a do moço, foi ao jardim, e quando viu o Tobias, disse — sete botões; e o cravo foi logo da fada e é agora meu; ei-lo aqui!...
— Isto é uma invenção; eu não conheço essa flor.
— Bem então consentireis que eu a traga esta manhã no meu peito?... Se não confessais, eu a mostrarei... O senhor coronel ainda se não retirou e...
— Perdoe-me, balbuciou, enfim, d. Quinquina, deixando cair uma lágrima na mão de Augusto. Dê-me esse maldito cravo.
— Eu vo-lo darei na hora de minha partida, senhora; porém, ouvi mais.
— Basta.
— Pois bem, basta; mas eu vejo que vossa face está umedecida; seria uma lágrima se o relento da noite não molhasse também a rosa. Quereis descansar sem dúvida; poderei gozar o prazer de conduzir-vos até à porta da gruta?...
— Sim, senhor.
Duas guerreiras tinham sido batidas; só a curiosidade retinha as outras; Augusto se chegou para elas e falou a d. Clementina:
— Agora vós, senhora.
Ela deixou-se levar pela mão até junto da fonte, e o estudante começou:
— Quereis fatos de anteontem ou da noite passada, senhora?
Eu não entendo o que o senhor quer dizer.
— Pergunto, senhora, se vos dá gosto que eu vos repita o que convosco se passou, quando tomáveis um sorvete ao lado de um jovem de cabelos negros... o que convosco conversou o meu colega Filipe, quando tomáveis chá?
— Eu não preciso saber mais nada disso.
— Então dir-vos-ei o que mais vos interessa; sossegarei mesmo os vossos cuidados e os de sr. Filipe, a respeito da perda de certo objeto...
— Sr. Augusto!
— Senhora, foi a fada desta misteriosa fonte quem vos roubou um precioso embrulho que continha uma trança de vossos cabelos e que deveria ser achado embaixo da quarta roseira da rua que vai ter
— Sr. Augusto!
— Senhora, foi a fada desta misteriosa fonte quem vos roubou um precioso embrulho que continha uma trança de vossos cabelos e que deveria ser achado embaixo da quarta roseira da rua que vai ter ao caramanchão; e essa trança pára hoje em minhas mãos, ei-la aqui...
— Oh! Dê-ma.
— Não preferis antes que eu a entregue ao feliz para quem a destináveis?
— Não, eu lhe peço que ma dê.
— Eu estou pronto a obedecer-vos, senhora, mas só na hora de minha partida. Vós quatro queríeis zombar de mim, e não concebo até onde iria a vossa vingança; preciso de reféns que assegurem a paz entre nós, estes são os meus; quereis saber mais alguma coisa?
— Eu já sei que o senhor sabe demais!
— Então...
Quer, como às duas primeiras,