A Ordem. Daniel Silva

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A Ordem - Daniel Silva HARPERCOLLINS PORTUGAL

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geolocalização.

      — Em linguagem de leigos, por favor? — pediu Donati.

      — Depois de nos infiltrarmos num telefone, conseguimos ouvir as chamadas do dono do aparelho, ler os e-mails e as mensagens e monitorizar os sites a que acede na Internet. Até podemos tirar fotografias e fazer vídeos e usar o microfone como dispositivo de escuta.

      — É como se fossem Deus.

      — Não exatamente, mas sem dúvida que temos o poder de perscrutar a alma de alguém. Conseguimos conhecer os seus medos mais sombrios e os seus desejos mais profundos. — Gabriel abanou pesarosamente a cabeça. — A indústria de telecomunicações e os seus amigos de Silicon Vallley prometeram-nos um admirável mundo novo de conveniência, tudo nas pontas dos dedos. Mentiram-nos intencionalmente. Roubaram-nos a privacidade. E destruíram tudo.

      — Tudo?

      — Jornais, filmes, livros, música… tudo.

      — Não sabia que eras assim tão ludita.

      — Sou restaurador de arte, especializado em Velhos Mestres italianos. Sou um membro fundador do clube.

      — E, no entanto, usas telemóvel.

      — Um telemóvel muito especial. Nem os meus amigos da NSA americana conseguem penetrar nele.

      Donati levantou um Nokia 9 Android.

      — E o meu?

      — Ia sentir-me muito melhor se o atirasses pela janela.

      — A minha vida está neste telefone.

      — Aí é que está o problema, Vossa Excelência.

      A pedido de Gabriel, Donati entregou o telemóvel a Chiara. Depois de o desligar, removeu-lhes o cartão SIM e a bateria e colocou-os na sua mala. Devolveu a carcaça sem alma a Donati.

      — Já me sinto melhor.

      Pararam para tomar café num autogrill perto de Orvieto e chegaram à periferia de Florença uns minutos depois do meio-dia. Os sinais de Zona Traffico Limitato piscavam a vermelho. Gabriel deixou o Mercedes num parque de estacionamento público próximo da Basilica di Santa Croce e, juntos, partiram em direção a São Marcos.

      Segundo a luz azul no telemóvel de Gabriel, o aparelho de Janson estava a oeste do Museu de São Marcos, provavelmente na Via San Gallo. A Unidade 8200 advertira-o de que o sinal de geolocalização tinha um raio de imprecisão de cerca de quarenta metros, o que significava que o telefone também poderia estar na Via Santa Reparata ou na Via della Ruote. As três ruas eram flanqueadas por pequenos hotéis baratos e hostels.

      O local exato sobre o qual o ponto azul repousava correspondia a um hotel chamado, apropriadamente, Piccolo. Precisamente em frente, no outro lado da rua, havia um restaurante, onde Gabriel almoçou como se fosse um homem para quem o tempo não interessava. Donati, com o telefone novamente montado e operacional, comeu na Via Santa Reparata, e Chiara ao virar da esquina, na Villa della Ruote.

      Gabriel e Chiara tinham, cada um no seu telemóvel, uma cópia da fotografia oficial de Janson na Guarda Suíça. Mostrava um jovem sério, de cabelo curto, pequenos olhos escuros e rosto angular. De confiança, pensou Gabriel, mas de forma nenhuma um santo. A ficha de Janson indicava que tinha um metro e oitenta e dois de altura e um peso de setenta e cinco quilos.

      Às três e um quarto, não havia qualquer sinal dele. Chiara mudou-se para o restaurante em frente do Hotel Piccolo, Donati para a Villa della Ruote. Na Via Santa Reparata, Gabriel passou grande parte do tempo a fitar o telefone, exortando a luz azul intermitente a que se movesse. Às cinco horas, doze horas após a sua descoberta inicial, a posição mantinha-se inalterada. Desalentado, Gabriel evocou uma imagem de um smartphone sem ligação à corrente a esgotar-se lentamente num quarto abandonado, repleto de embalagens vazias de takeaway.

      Uma mensagem de Chiara animou-lhe o espírito. Já engordei sete quilos. Se calhar, devíamos simplesmente ligar para o número.

      E se ele esteve envolvido?

      Pensei que tinhas dito que ainda não estávamos nesse ponto.

      Não estamos. Mas estamos mais perto a cada minuto que passa.

      Às cinco e meia, mudaram de posições pela segunda vez. Gabriel foi para um restaurante na Villa della Ruote. Instalou-se numa mesa na rua e, sem apetite, mordiscou um prato de spaghetti pomodoro.

      — Se não estiver ao seu gosto — disse o empregado de mesa —, posso trazer-lhe outra coisa.

      Gabriel pediu um café duplo, o seu quinto da tarde, e, com uma mão ligeiramente trémula, agarrou no telemóvel. Tinha outra mensagem de Chiara.

      Dez quilos. Estou a implorar-te, por favor, liga-lhe.

      Gabriel sentiu-se seriamente tentado a fazê-lo. Em vez disso, observou os turistas que se arrastavam para os seus hotéis, depois de um longo dia a experimentarem as delícias de Florença. Havia quatro hotéis ao longo da rua. Aquele que se chamava, desadequadamente, Grand Hotel Medici ficava ao lado do restaurante, diretamente no ângulo de visão de Gabriel.

      Consultou as horas no telemóvel. Eram seis e um quarto. Depois, verificou a posição da luz, no mapa de geolocalização, e detetou o que parecia ser um ligeiro indício de movimento. Trinta segundos adicionais de observação rigorosa confirmaram a sua suspeita. A luz estava, definitivamente, a mover-se.

      Devido à margem de erro de quarenta metros, Gabriel informou rapidamente Chiara e Donati do que descobrira. Donati respondeu que não havia sinal de Janson na Via San Gallo e, alguns segundos depois, Chiara relatou o mesmo a partir do seu posto avançado na Via Santa Reparata. Gabriel não respondeu a nenhuma das mensagens, pois estava a escrutinar o homem que acabara de sair do Grand Hotel Medici.

      Vinte e muitos anos, cabelo curto, cerca de um metro e oitenta, talvez uns setenta e sete quilos. Percorreu rapidamente a rua com o olhar, em ambas as direções, e, depois, dirigiu-se para a direita, passando pelo restaurante. Gabriel pousou duas notas novas na mesa, contou lentamente até dez e levantou-se. De confiança, estava a pensar. Mas de forma nenhuma um santo.

      13

      FLORENÇA

      Chiara e Donati aguardavam na Via Ricasoli, imersos na correnteza de visitantes que saía da Galleria dell’Accademia. Sem qualquer aviso, ela lançou os braços em redor do pescoço de Donati e puxou-o para si.

      — Isto é mesmo necessário?

      — Não queremos que ele veja o teu rosto. Pelo menos, para já.

      Deu um abraço apertado a Donati, enquanto Niklaus Janson furava entre a multidão e passava por eles sem um olhar de relance. Gabriel surgiu na rua passado um momento.

      — Há alguma coisa que vocês os dois queiram dizer-me?

      Donati libertou-se e endireitou cuidadosamente o casaco.

      — Ligo-lhe agora?

      — Primeiro, seguimo-lo. Depois, ligamos.

      —

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