Mestres da Poesia - Fernando Pessoa. Fernando Pessoa

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Mestres da Poesia - Fernando Pessoa - Fernando Pessoa Mestres da Poesia

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Amor são Ridículas

      Todas as cartas de amor são

      Ridículas.

      Não seriam cartas de amor se não fossem

      Ridículas.

      Também escrevi em meu tempo cartas de amor,

      Como as outras,

      Ridículas.

      As cartas de amor, se há amor,

      Têm de ser

      Ridículas.

      Mas, afinal,

      Só as criaturas que nunca escreveram

      Cartas de amor

      É que são

      Ridículas.

      Quem me dera no tempo em que escrevia

      Sem dar por isso

      Cartas de amor

      Ridículas.

      A verdade é que hoje

      As minhas memórias

      Dessas cartas de amor

      É que são

      Ridículas.

      (Todas as palavras esdrúxulas,

      Como os sentimentos esdrúxulos,

      São naturalmente

      Ridículas.)

      Se te Queres

      Se te queres matar, por que não te queres matar?

      Ah, aproveita! que eu, que tanto amo a morte e a vida,

      Se ousasse matar-me, também me mataria...

      Ah, se ousares, ousa!

      De que te serve o quadro sucessivo das imagens externas

      A que chamamos o mundo?

      A cinematografia das horas representadas

      Por atores de convenções e poses determinadas,

      O circo policromo do nosso dinamismo sem fím?

      De que te serve o teu mundo interior que desconheces?

      Talvez, matando-te, o conheças finalmente...

      Talvez, acabando, comeces...

      E, de qualquer forma, se te cansa seres,

      Ah, cansa-te nobremente,

      E não cantes, como eu, a vida por bebedeira,

      Não saúdes como eu a morte em literatura!

      Fazes falta? Ó sombra fútil chamada gente!

      Ninguém faz falta; não fazes falta a ninguém...

      Sem ti correrá tudo sem ti.

      Talvez seja pior para outros existires que matares-te...

      Talvez peses mais durando, que deixando de durar...

      A mágoa dos outros?... Tens remorso adiantado

      De que te chorem?

      Descansa: pouco te chorarão...

      O impulso vital apaga as lágrimas pouco a pouco,

      Quando não são de coisas nossas,

      Quando são do que acontece aos outros, sobretudo a morte,

      Porque é coisa depois da qual nada acontece aos outros...

      Primeiro é a angústia, a surpresa da vinda

      Do mistério e da falta da tua vida falada...

      Depois o horror do caixão visível e material,

      E os homens de preto que exercem a profissão de estar ali.

      Depois a família a velar, inconsolável e contando anedotas,

      Lamentando a pena de teres morrido,

      E tu mera causa ocasional daquela carpidação,

      Tu verdadeiramente morto, muito mais morto que calculas...

      Muito mais morto aqui que calculas,

      Mesmo que estejas muito mais vivo além...

      Depois a trágica retirada para o jazigo ou a cova,

      E depois o princípio da morte da tua memória.

      Há primeiro em todos um alívio

      Da tragédia um pouco maçadora de teres morrido...

      Depois a conversa aligeira-se quotidianamente,

      E a vida de todos os dias retoma o seu dia...

      Depois, lentamente esqueceste.

      Só és lembrado em duas datas, aniversariamente:

      Quando faz anos que nasceste, quando faz anos que morreste.

      Mais nada, mais nada, absolutamente mais nada.

      Duas vezes no ano pensam em ti.

      Duas vezes no ano suspiram por ti os que te amaram,

      E uma ou outra vez suspiram se por acaso se fala em ti.

      Encara-te a frio, e encara a frio o que somos...

      Se queres matar-te, mata-te...

      Não tenhas escrúpulos morais, receios de inteligência! ...

      Que escrúpulos ou receios tem a mecânica da vida?

      Que escrúpulos químicos tem o impulso que gera

      As seivas, e a circulação do sangue, e o amor?

      Que memória dos outros tem o ritmo alegre da vida?

      Ah, pobre vaidade de carne e osso chamada homem.

      Não vês que não tens importância absolutamente nenhuma?

      És importante para ti, porque é a ti que te sentes.

      És tudo para ti, porque para ti és o universo,

      E o próprio universo e os outros

      Satélites da tua subjetividade objetiva.

      És importante para ti porque

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