Uma vingança deliciosa. Jane Porter
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Tinha tirado o casaco e desabotoado a camisa. Quando os seus olhos se encontraram, ela pensou que os dele eram mais claros do que tinha imaginado, embora o nariz dominasse o seu rosto. Tinha uma pequena cicatriz entre os olhos e outra no seu queixo quadrado. Era um rosto que dava a impressão de ter recebido mais do que uma tareia. De um boxeador de rua. Ou de matador.
Reparou no nó da garganta. Engoliu a saliva e o terror fez com que sentisse como se as extremidades pendessem sobre pedaços de cristal.
– Não vais entrar? – perguntou ele.
Esteve quase a matá-la o facto de ter que forçar um som pela garganta.
– Não se importa se ficar cá fora?
– Agora que estamos aqui, podes fazer o que quiseres.
– Sim?
– Não há telefone nem comunicação com o exterior. Nem visitantes, nem estradas, nem incómodos nem interrupções. Estás a salvo.
Ela cerrou os dentes e umas lágrimas ardentes queimaram-lhe os olhos.
– A salvo?
Ele esticou a mão para lhe tocar no início do pescoço, mesmo por baixo do queixo e os dedos mexeram-se sob a pele que não lhe tapava a gola virada da camisola.
– Perfeitamente a salvo.
Estremeceu e sobressaltou-se com o contacto aceso e doloroso.
– Não há mais ninguém aqui?
– Só uma criada velha, mas não fala inglês e não te vai incomodar.
Levantou o dedo do pescoço e Zoe sentiu como se a tivesse partido ao meio. O contacto tinha sido leve, mas tinha acendido uma bomba por baixo da sua pele, fazendo que no centro dela explodisse o calor e que o fogo lhe sulcasse as veias. Quis gritar, embargada pela intensidade da sua reacção.
– Entra. Estás cansada.
– Tenho medo.
– De quê? – pôs a cabeça de lado.
A voz baixa palpitou dentro de Zoe. Odiava-o, temia-o e, no entanto, também lhe parecia estranhamente carismático. «Era só o que me faltava», pensou, mas não se atreveu a manifestá-lo em voz alta.
Ele devia ter-lhe lido os pensamentos, porque esboçou um leve sorriso.
– Considera isto uma pequena aventura – depois afastou-se para a deixar entrar.
Uma aventura? Estava louco.
Os particulares olhos claros do desconhecido olharam-na enquanto esperava, sem falar nem apressá-la. Ia deixar que escolhesse.
O que é que devia fazer? Ficar cá fora, na escuridão das pampas infinitas, ou entrar no resplendor quente da casa?
Com o coração nas mãos, entrou.
Lazaro viu Zoe Collingsworth assim que atravessou a porta naquela tarde. Jovem, loura, linda. Com olhos semicerrados, tinha seguido os seus movimentos enquanto ela procurava na mala de pele os seus óculos de sol.
As mãos tremiam-lhe ao acomodá-los no nariz recto e pequeno. Podia ter sido uma estrela de Hollywood. A camisola de gola alta parava mesmo por baixo do queixo, acentuando a cara branca e suave e o longo cabelo louro.
Muitos olhos se viraram para observar os seios voluptuosos sob a fina camisola preta e as ancas tão femininas metidas nas calças de lã de uma cor camelo muito tentadora. O cabelo era natural, como o da sua irmã Daisy, só que mais dourado. De facto, eram muito parecidas.
Dois anos depois de ter casado com o conde Dante Galván, Daisy já era considerada uma grande beleza nos círculos sociais de elite da Argentina, mas Zoe possuía uma beleza diferente… mais suave.
Lazaro fechou a porta do rancho, mas não se incomodou em trancá-la. Zoe não tinha nenhum sítio para onde ir.
Observou-a naquele momento, enquanto entrava no corredor, os olhos azuis muito abertos e apreensivos. Estudou o interior, como se procurasse uma porta oculta ou uma câmara de tortura secreta.
– Não há nada de sinistro aqui – indicou com calma. – Nada de facas, armas de fogo, chicotes ou algemas. É somente um rancho.
Ela levantou o queixo e apertou os lábios.
– Já enviou o pedido de resgate?
– Não.
Viu-a pestanejar. Era tão jovem. Quase doze anos mais nova do que ele. Separava-os uma vida inteira. A diferença de idade devia ter aplacado a atracção. Mas não.
Desde o primeiro momento em que a viu no aeroporto, as entranhas tinham-se-lhe encolhido. A reacção que despertava nele atordoava-o. Era muito primitiva, tão física que se sentia em carne viva. Mal controlado.
O desejo palpitou naquele instante e o corpo voltou a contrair-se.
Sentia-se faminto. Como uma criatura pré-histórica renascida dos mortos. Algo nela fazia com que a desejasse, que se sentisse faminto. Implacável.
Queria senti-la, prová-la, possui-la. E numa parte distante do cérebro sabia que o faria.
Algum dia.
Quando tivesse esmagado os Galván.
Quando tivesse conseguido a sua vingança.
Mas aquele não era o momento. Nesse instante, ela estava esgotada e receosa, e era uma convidada na sua casa.
– Dá-me o casaco – indicou, suavizando a voz, já que sabia que tinha uma voz e uns modos duros. Não era conhecido pela sua sensibilidade ou cortesia.
Estendeu uma mão, mas ela deu um passo para trás, assustada.
Zoe esteve quase a gritar quando ele lhe esticou a mão. Não podia deixar que lhe tocasse outra vez. Não podia permitir que se aproximasse, que conseguisse que se sentisse presa, impotente, demasiado vulnerável. Havia algo nele que emanava força, não só em termos de musculatura, como de controlo… de poder.
Fechou o casaco fino em torno do corpo.
– Gostaria de ficar com ele.
– Vais recuperá-lo – levantou as sobrancelhas.
Gozava com ela. Corou e levantou o queixo.
– Tenho frio.
– Então, aproxima-te do fogo. Vais ficar mais quente.
Conduziu-a desde do hall de tecto alto a um salão surpreendentemente espaçoso, com vigas escuras, tão rústicas como a lareira de pedra que ia do chão ao tecto. No entanto, os móveis eram luxuosos, desde a alcatifa de umas vibrantes cores em tons de escarlate e ouro que cobria o chão de madeira