O príncipe cruel. Jane Porter
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– Lamento.
– Não me lembro dela – comentou ela, encolhendo os ombros outra vez.
– Ela aprovaria a vida que levas aqui?
– Ela também era vulcanóloga. Trabalhou dez anos com o meu pai e fizeram o que ele está a fazer agora, mas no Havai. Acho que sim, que aprovaria. Talvez só lamentasse que não tivesse ido à universidade. Eduquei-me em casa, até na educação universitária, mas, segundo o meu pai, tenho mais conhecimentos que os alunos dele, embora não seja o mesmo. Nunca tive de competir para trabalhar, limito-me a trabalhar.
– Qual é a tua… especialidade?
– Também sou vulcanóloga, mas gosto sobretudo da relação com a arqueologia…
– O Vesúvio?
– Sim. Tive a sorte de trabalhar com o meu pai no setor sudoeste do Vesúvio. Não só me fascinam as civilizações perdidas, mas também a capacidade dos vulcões para configurarem a paisagem e reescreverem a história da humanidade.
– Não parece que tenhas perdido nada por teres estudado em casa…
– Segundo o meu pai, não sei comportar-me em sociedade – ela sorriu levemente. – Sinto-me incómoda nas cidades entre muita gente, mas, felizmente, aqui não temos esse problema.
– A tua mãe também era dos Estados Unidos?
– Era canadiana francófona, do Quebeque. É por isso que me chamo Josephine – ele apertou os dentes e os lábios. – Recordarás o teu nome, é só uma questão de tempo.
– Falaste-me em francês, não foi?
– Tentei vários idiomas, mas respondeste em italiano e continuei em italiano. Est-ce que tu parles français?
– Oui.
– E Inglês…? – perguntou ela mudando de idiomas. – Compreendes-me?
– Sim – respondeu ele assentindo com a cabeça.
– Custa-te seguir-me? – perguntou ela sem deixar o inglês.
– Não, é como com o italiano.
Não tinha quase pronúncia estrangeira e parecia mais americano que britânico. Supôs que teria estudado algures nos Estados Unidos.
– Então, importa-te que falemos em inglês?
– Não.
– Mas se te fizer dor de cabeça ou te stressar…
– Não precisas preocupar-te comigo, estou bem.
Ela ia contrariá-lo, mas pensou duas vezes. Era um homem habituado a dizer a última palavra.
Quem era? Por que irradiava poder mesmo naquele momento?
– Fala-me das pessoas que estavam comigo no iate. Conta-me tudo o que souberes.
– Depois de comeres qualquer coisa.
– Já não tenho fome.
– Que estranho, acho que eu também estou a perder a memória.
– Não acho graça – contrapôs ele, com um olhar duro.
– Nem eu. Passaste um mau bocado e tens de recuperar as forças. Como eu sou a tua cuidadora…
– Não gosto de ser mimado.
– Eu não mimo ninguém. Se comeres, conto-te tudo. Se não comeres, terás de aguentar-te porque tenho outras coisas para fazer, além de discutir contigo.
Ele apertou os dentes. Evidentemente, a situação não lhe agradava, mas agarrou o prato com frango e provou… até que acabou por devorá-lo.
– Está muito bom – reconheceu ele, olhando-a nos olhos.
– Obrigada.
– Foste tu que fizeste?
– Sim.
– Como?
– Tenho um congelador e uso o forno do exterior para assar as batatas. O resto faço ao fogo.
– Um forno exterior?
– Também faz umas pizzas belíssimas. Aprendi a usá-lo quando vivemos no Peru. Adorava o Peru. E o meu pai adorava o estratovulcão.
Ela sorriu ao recordar a emoção do pai quando o Sabancaya rugia e começava a lançar cinzas. Se não fosse pelas mulheres locais, teria ficado abandonada. No entanto, acolheram-na e ensinaram-lhe a cozinhar e ela, em troca, cuidava dos filhos delas, assim as mães podiam descansar um pouco.
– E em que outros sítios viveste?
– No estado de Washington, no Havai, Peru e Itália, mas aqui é onde estamos há mais tempo.
– Todos os lugares eram assim tão isolados?
– Não, este é o mais remoto, mas estou muito contente.
– Foi por isso que nos viste na praia e não te apresentaste?
– Somos de mundos diferentes – ela riu-se e retirou-lhe o prato. – Seria um ser exótico no teu mundo.
– Achas que sim? – perguntou ele, franzindo a testa.
– Claro. Não sei estar rodeada por homens bonitos. Não poderia estar a apanhar sol, tenho de estar ativa, estaria a pescar ou a estudar os lençóis freáticos para imaginar a história vulcânica… – ela calou-se por um instante. – Não sou o teu tipo de rapariga.
– Qual é o meu tipo?
– Uma rapariga que parece uma modelo em fatos de banho, que não carega nem a sua própria mala da praia, que se chateia se não tiveres vontade de conversar.
– Muito interessante – comentou ele com um brilho nos olhos azuis.
– O quê?
– Não gostas dos meus amigos. Não o tinhas dito antes, é uma informação nova.
– Não deveria ter dito nada. Não é importante…
– Mas isso diz muito sobre ti.
– Exatamente. Não preciso dizer-te o que sinto, deveria limitar-me a ajudar-te. É indiferente quem eu sou ou o que sinto.
– Podes ter opiniões.
– E expressá-las se servem para algo. Julgar as tuas amigas não serve de nada.
– Não sei porquê, mas pareces ser… especial.