A meio da noite - Segura nos seus braços. Margaret Way
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Ela continuou a olhar para ele, com as pupilas a contraírem-se até ficarem do tamanho de uma cabeça de alfinete. Reconheceu que aquela frase não era o seu melhor esforço, mas tinha o cérebro em greve depois do que lhe parecera uma semana num avião, e uma chávena de chá oferecer-lhe-ia mais quinze minutos até conseguir convencer Adele.
– Fiz uma viagem realmente longa – acrescentou.
Ela ficou tão quieta, dura e fria como o granito das bancadas da cozinha. E precisamente quando achava que se tinha solidificado e que permaneceria dessa forma para sempre, abanou a cabeça e foi buscar uma chaleira. Vigiou-a bem. Quando Adele estava com aquele humor, a probabilidade de pôr a chaleira ao lume era tão grande como a de a atirar contra ele.
Encheu-a de água de costas para ele enquanto repetia a sua pergunta anterior:
– O que queres, Nick?
Ele esperou que se virasse.
– Precisamos de conversar.
Ela abanou a cabeça.
– Não. Precisávamos de conversar há meses. Agora é demasiado tarde.
– Tenho um assunto importante que preciso de discutir contigo.
– Pois!
Nick encolheu-se.
– O que significa esse «pois»?
– Tu não sabes o que é importante, não é verdade, Nick? Ou responsável, ou confiável, ou algo que possa requerer o mínimo de seriedade.
Adele estava à ofensiva. Todas as suas boas intenções caíram e recorreu à única forma de defesa que funcionava. Sorriu levemente.
– Faz parte do meu encanto.
Ela não mostrou nem um pequeno sinal de sorriso. Nada corria como ele planeara. Estava tão cansado que não conseguia pensar com coerência, por isso experimentou a única coisa do seu arsenal que garantia uma reacção.
Os momentos desesperados requeriam medidas desesperadas.
Sorriu um pouco mais e observou-a, tentando ver algum sinal de degelo. Sabia que ela era incapaz de resistir às suas covinhas.
– Pára, Nick.
Encolheu os ombros com absoluta inocência.
– Eu sei o que estás a fazer e não vai funcionar.
Seria a primeira vez.
Era evidente que Adele acrescentara uns centímetros de armadura na sua ausência. Contudo, havia sempre fendas, só tinha de as localizar. De facto, fora uma das coisas que mais o atraíra nela ao princípio; aquela fachada gelada que ocultava um núcleo abrasador. Fogo e gelo…
Caminhou para ela e viu-a recuar.
– Disseste que querias falar? Bom, neste momento estou ocupada.
– Posso ver que sim – olhou para ela de cima a baixo e sentiu uma familiar onda de calor ao ver uma bonita perna revelada pela abertura do robe.
Adele ergueu-se e ajustou ainda mais o cinto do robe.
– Telefona-me para o escritório na próxima semana. Estou no meio de um grande projecto, mas talvez na quinta-feira tenha alguns minutos para te dedicar. Onde vais ficar?
Nick arqueou o sobrolho e olhou para ambos os lados.
– Nem sonhes! Não vais ficar aqui.
Ele pestanejou.
– Também é o meu lar.
– Correcção: podia ser a tua casa, mas deixou de ser o teu lar assim que atravessaste o Atlântico e não te incomodaste em voltar em nove meses.
Cruzou os braços e olhou para ele. Nick decidiu que não era o momento certo para lhe recordar que voltara… assim que pudera. Duas curtas semanas depois da monumental discussão, viajara oito mil quilómetros para resolver a situação. Contudo, ao entrar em casa, encontrara-a vazia. Adele mudara de casa e estava a viver com a sua melhor amiga.
Estava claro que Adele não estava de humor para enfrentar os erros que cometera. Para ser sincero, ele também não se achava capaz de encarar as lembranças. Assim, desterrou-as para um canto do cérebro.
Tirou o casaco, pô-lo nas costas de uma das cadeiras que rodeavam a grande mesa de pinho e deixou-se cair no fofo sofá embutido num canto da ampla cozinha de estilo vaqueiro.
– E esse chá?
Adele fechou os olhos e afundou os ombros. Ganhara o primeiro assalto, porém, Nick teve vontade de se dar um pontapé no rabo por a fazer parecer tão cansada.
– Fá-lo tu. Eu vou lá acima. E se pensas que vais pôr essa mala que largaste no hall no meu quarto, pensa melhor. Sabes onde é o outro quarto.
Aquilo doeu-lhe.
Fez uma careta quando Adele se virou e subiu as escadas com determinação. Não lidara bem com a situação, porém, teria sido uma temeridade continuar com a discussão. Há muito tempo, aprendera que a solução era fazê-la rir-se.
Tinha um excelente sentido de humor, porém, a maioria do tempo mantinha-o afastado. E, se era bom em alguma coisa, era em fazer a sua esposa rir-se.
Deixou que a sua cabeça caísse sobre as costas do sofá e fechou os olhos.
Sabia o que ela pensava: que o seu marido escolhera um emprego que surgia uma vez na vida em vez dela. Adele estava demasiado ocupada a mostrar-se arrogante para ver que fora ela quem se recusara a ceder um só centímetro. Fora uma decisão dela pôr o casamento em espera.
Podia haver dois lados para cada história, contudo, Adele estava sempre convencida de que a sua versão era a versão certa. O que era extremamente irritante, pois realmente tinha quase sempre razão. No entanto, de vez em quando, entendia as coisas espectacularmente mal. E então, geralmente, tratava-se de algo importante.
Adoptou uma posição mais confortável. A diferença horária começava a fazer-se sentir e aquele sofá era cómodo. O casaco de um dos fatos dela estava sobre as costas. Cheirava ao seu perfume, quente e penetrante. Se fechasse os olhos, era como se ela estivesse sentada ao seu lado.
Tinham passado muitas noites felizes aninhados naquele velho sofá, com dois copos de vinho depois do jantar. E houvera outras ocasiões em que tinham usado o sofá para actos muito menos relaxantes…
Sorriu enquanto adormecia. Menos relaxantes, mas muito mais divertidos.
A porta da cozinha rangeu levemente quando Adele a abriu. Fez uma pausa. Reinava o silêncio. Demasiado silêncio. Nick era como um pirralho e, se estava em silêncio, o mais provável era que estivesse a tramar alguma coisa. Abriu mais a porta e viu-o deitado sobre o sofá, a dormir como um bebé.
Até aquela