A meio da noite - Segura nos seus braços. Margaret Way
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– Eh… bom, é essa a questão. Na verdade, não lhe falei dos nossos…
Adele sentiu que a tensão a invadia um pouco mais.
– Nossos?
– Dos… nossos… problemas.
O prato sobre a mesa dançou à frente dos seus olhos. A sensação de que Nick voltara a fazê-lo, de que voltara a fugir de uma situação difícil, deixando que outra pessoa lidasse com as consequências, acomodou-se junto ao seu ouvido, sussurrando-lhe coisas desagradáveis.
Disse para si que não podia ser tão idiota. Olhou para ele. O seu sorriso confirmou-lhe tudo, já que recorria sempre a ele quando sabia que alguma coisa ia despertar a sua irritação.
Custou-lhe muito não levantar o prato e atirá-lo, com molho e tudo, à sua cabeça. De facto, devia receber uma medalha por ter conseguido levantar-se e sair do restaurante sem sofrer uma combustão espontânea.
Era tão típico de Nick! Perguntou-se porque deixara que abrisse a boca, quando sabia que dela não poderia sair nada bom, mas permitira que ele a abrisse, como a idiota que era.
Pelo canto do olho, viu o brilho de um casaco castanho e soube que Nick conseguira pagar e sair atrás dela.
Não estava preparada para falar com ele naquele momento. Por sorte, tinham decidido ir a pé até ao pub mais próximo para almoçarem. Só demoraria dez minutos a chegar a casa.
Ouviu o som seco das suas botas sobre a calçada. Disse para si que, se mantivesse aquele ritmo, com oito passos ele acabaria por a alcançar. Teria de andar mais depressa.
Nick seguiu-a. Quis correr, porém, uma voz interior sussurrou-lhe que seria melhor deixar que a sua mulher se acalmasse um pouco. Acelerou.
Como ela andava depressa quando se irritava daquela maneira! Demorou mais de um minuto até se situar a uma distância que lhe permitisse falar com ela.
– Adele!
Nem sequer virou a cabeça. Simplesmente, levantou uma mão na sua direcção.
– Vá lá, Adele. Por favor?
Nesse momento, viu-se obrigada a parar à frente de um cruzamento e ele alcançou-a.
– Não! – avisou-o Adele quando ele ia abrir a boca. – Não o faças.
Fechou-a.
– Desta vez superaste-te, Nick. Não posso acreditar que apareças passados nove meses, sem qualquer tipo de contacto, para me convidares para uma festa de aniversário – riu-se e abanou a cabeça. – É um nível novo de insensibilidade, mesmo para ti.
Um momento!
Quantas vezes tentara telefonar e desculpar-se nos dias seguintes à sua partida? Quantas vezes ela lhe desligara o telefone na cara antes que pudesse emitir uma sílaba? Se não tinham comunicado em nove meses, era mais culpa de Adele do que dele. Pelo menos, ele tentara fazê-lo.
No final, fizera o que evidentemente ela queria, deixando-a em paz. E agora culpava-o disso?
– Bom, talvez tu tenhas todas as respostas, Adele, mas eu não.
Ela recuou e olhou para ele.
– O que estás a insinuar?
– Que eu não tenho a certeza do que se passa connosco. O que é? Estamos separados ou realmente foi um longo período de arrefecimento depois de uma discussão? Se eu não consegui decifrá-lo, como vou poder defini-lo a outra pessoa? Tu não aceitavas falar comigo. Não faço ideia do que se passa na tua cabecinha ordenada.
Adele abanou a cabeça e atravessou a rua. Ele teve de esperar que vários carros virassem pela esquina para voltar a alcançá-la. Afastou a sua intenção de esperar até que ela quisesse conversar sobre eles. Esperara nove meses e ia obter as suas respostas nesse mesmo instante.
– Então, o que contaste às pessoas, Adele? Qual foi a tua posição no assunto?
E então calou-se. Sabia exactamente o que teria contado às suas amigas. Mona aproveitar-se-ia do detalhe mais pequeno e teria a certeza de que ele era um vilão, enquanto Adele saía impoluta e a cheirar a rosas. Aquela mulher às vezes era tão teimosa…
Caminhou junto a ela em silêncio. Devia ter ouvido o seu instinto. Adele não estava de humor para oferecer explicações razoáveis e qualquer coisa que dissesse só serviria para piorar as coisas enquanto continuasse naquele estado.
Enquanto esperava que abrisse a porta de casa, as faíscas que saíam dela eram quase tangíveis.
– Vou lá para cima – disse, deixando a porta aberta.
Ele entrou e fechou-a. Apesar das doze horas que dormira, começava a sentir-se cansado outra vez. Foi para a sala e ligou a televisão. Talvez pudesse dormir um pouco.
Adele acabaria por se acalmar. Era o que acontecia sempre. Tinha uma fúria explosiva, mas que geralmente também se consumia depressa. Depois de ligar a televisão, deixou-se cair na sua poltrona favorita. Dentro de quinze minutos, iria preparar-lhe uma chávena de chá como oferenda de paz para que pudessem conversar sem que declarasse a Terceira Guerra Mundial.
Um pouco mais tarde, precisamente quando pensava em levantar-se para pôr a chaleira ao lume, ouviu-a descer as escadas. De facto, ouviu uma série de ruídos, depois «tump, tump, tump», como se houvesse duas pessoas a descer cada degrau.
Chegou ao hall mesmo a tempo de a ver lutar com a sua mala nos últimos três degraus.
– Adele? O que raios estás a fazer?
Ela parou, em parte para responder e em parte para recuperar o fôlego. Doíam-lhe os braços. Perguntou-se como podiam umas quantas camisas enrugadas pesar tanto.
– Pensei que era bastante óbvio, não? Estou a expulsar-te daqui.
A expressão da cara dele era clássica. Se não estivesse disposta a matá-lo, desataria a rir-se.
– Não podes expulsar-me. Eu também vivo aqui.
– Já não. Podes procurar outra pobre desgraçada para enganar. Para mim, acabou-se.
Ao compreender as implicações das suas palavras, perguntou-se se realmente quatro anos de casamento tinham chegado àquele ponto. Olhou para Nick e sentiu-se pior, pois as suas palavras tinham-lhe apagado as covinhas da cara. Devia sentir-se satisfeita por ele finalmente ter compreendido, porém, de repente, sentiu lágrimas nos olhos.
– Lamento muito, Adele. A sério. Devia ter dito à minha mãe… qualquer coisa – abanou a cabeça. – Mas ela ama-te como a uma filha e não quis perturbá-la. Não está muito bem…
Engoliu o resto da frase e ela sentiu o coração apertado ao vê-lo lutar com as palavras.
– Esteve… quer dizer, ia sentir-se muito triste por nós.