Coração em dívida. Ким Лоренс

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Coração em dívida - Ким Лоренс Sabrina

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      – Não sei, tem um nome escocês… Fiona… Ah, não, Flora, creio.

      – E tem a custódia do menino?

      Ivo aferrou-se à ideia de que Bruno tinha um filho. Assim, talvez conseguisse ultrapassar o sentimento de culpa que o corroía. Ou seja, devia concentrar-se no menino, não na culpa. Mas… «Não se trata de ti, Ivo, mas do teu sobrinho», lembrou-se a si mesmo esboçando um meio sorriso sem sinal de humor.

      O avô, de repente, deu um murro na secretária.

      – É ridículo. Essa mulher não tem nada! – exclamou Salvatore com desdém.

      – Se queres fazer parte da vida do menino, talvez devas aprender a pronunciar o nome dela – sugeriu Ivo.

      – O que não quero é que ela faça parte da vida do menino. Essa família é culpada por eu ter perdido o meu neto.

      Era o ponto de vista do avô e a forma de ver as coisas que lhe tinham inculcado. E, por enquanto, não via motivo para considerar a situação de outra maneira.

      – Diz-me, isso não se vai repercutir no meu trabalho, avô? Talvez devesses ser mais realista e aceitar a situação.

      Salvatore semicerrou os olhos.

      – Foi isso que aprendeste comigo? Aceitar as situações? – atirou Salvatore. – Fiz-lhe uma oferta mais do que generosa! Mas recusou-a.

      – Ofereceste-lhe dinheiro em troca da custódia do menino? – o seu avô parecia ter perdido a subtileza e a sagacidade que o caracterizavam. – E surpreende-te que recusasse?

      – Sei perfeitamente porque o fez. É estéril, não pode ter filhos, por isso agarra-se ao menino – declarou Salvatore sombriamente. – A carta que me enviou, muito sentimental, a convidar-me a ir ver o rapazito… Não quero que essa família tenha nada a ver com a criança! Têm conseguido privar-me…

      A voz do idoso tremeu e os seus olhos pareceram ficar aguados. De sofrimento ou de ira?

      Ou só pelo facto de que alguém tinha tido a temeridade de o contrariar?

      Em qualquer caso, o idoso engoliu em seco e voltou o rosto. A sua repentina vulnerabilidade era evidente, em contraste com a força de uns anos atrás, muito diferente do momento em que teve de tirar do quarto um pequeno Ivo que tentava fazer o seu pai viver metendo-lhe comprimidos na boca. Precisamente os mesmos comprimidos que ele tinha tomado para se suicidar, pensando que eram medicamentos que o curariam, sem compreender que o seu pai tinha morrido de uma overdose desses comprimidos.

      Salvatore queria agora resgatar outro menino, tal como tinha feito com ele. Para Salvatore, era uma questão de linhagem.

      «E tens o direito de criticá-lo?», perguntou-se Ivo a si mesmo. «Para ti, é uma questão de aliviar o teu sentimento de culpa».

      Ivo endireitou os seus largos ombros. De repente, deu-se conta do que o avô queria realmente: criar aquela criança por ser parte de Bruno.

      – Obtiveste esta informação por tua conta ou é do domínio público?

      O avô, em jeito de resposta, encolheu os ombros e olhou para ele com ressentimento.

      Ivo não insistiu. Não o preocupavam os limites que Salvatore cruzava alegremente. O facto era que, à margem da culpa que sentisse e decidido a compensar a sua rejeição ao seu irmão, identificava-se com as motivações do avô.

      E não sentia necessidade de se desculpar por isso. Orgulhava-se de ser italiano, da cultura e da língua do seu país, tal como Bruno. Pensar que o filho de Bruno pudesse ser privado disso era incentivo suficiente para ultrapassar certos limites. A lealdade que devia ao seu apelido era inquestionável, algo profundo, por isso o tinha magoado tanto o abandono do seu irmão. Bruno tinha recusado o que lhes tinham ensinado a respeitar.

      Mas não o tinha recusado a ele, Bruno tinha voltado para levá-lo.

      E agora devia saldar a dívida com o seu irmão, estava decidido a fazê-lo. Criar o seu sobrinho devidamente seria, verdadeiramente, isentar-se.

      O avô, aparentemente recuperado, declarou:

      – Temos de encontrar uma maneira de a pressionar, mas não tem feito nada.

      – Referes-te a nada que se possa utilizar contra ela?

      – Corre o rumor de que teve relações com um futebolista, mas o futebolista não era casado na altura.

      – Nesse caso, que queres que faça? Que rapte o menino?

      Se o seu avô lhe tivesse respondido afirmativamente à pergunta não teria ficado tão perplexo como com a resposta que Salvatore lhe deu.

      – Quero que te cases com essa mulher e que tragas o menino para aqui. Os advogados dizem que isso te dará direitos. Conseguir a custódia do menino será simples depois do divórcio.

      Ivo lançou uma gargalhada feita de pura incredulidade. Quando tinha sido a última vez que se rira à frente do avô? Sem saber porquê, evocou mentalmente o riso do irmão. Ao partir, Bruno tinha levado também os risos daquela casa.

      – Já acabaste? – perguntou Salvatore quando o silêncio voltou a reinar na sala.

      – Parece que já pensaste muito neste assunto.

      – Vais dizer-me que não conseguirias fazer com que se apaixonasse por ti, se quisesses?

      – Obrigado pela confiança que tens em mim – disse Ivo com ironia ao mesmo tempo que se punha em pé. Então, pôs as mãos na secretária e acrescentou, pronunciando lentamente cada palavra: – Não quero fazer isso.

      Tinha chegado à porta quando o seu avô declarou nas suas costas:

      – Estou a morrer e quero que tragas o menino para aqui. Queres que o filho do teu irmão seja criado com uma desconhecida e que não aprenda o seu idioma, que não desfrute das vantagens que o seu apelido lhe dará? És assim tão egoísta?

      Ivo voltou-se muito devagar e cravou os olhos no enrugado rosto do avô. Sim, via-o envelhecido.

      – Isso é verdade?

      – Achas que diria algo assim se não fosse verdade?

      – Sim – respondeu Ivo sem vacilar.

      Salvatore lançou uma gargalhada e pareceu satisfeito. Evidentemente, sentia-se lisonjeado.

      – Quero manter alguma dignidade no que é um processo lamentável. Não vou aborrecer-te com os detalhes desagradáveis, mas estou a morrer e quero ver o menino. Fazes-me esse favor?

      Ivo soltou devagar o ar que tinha estado a conter nos pulmões.

      – Não posso prometer-te nada – respondeu Ivo fazendo uma promessa a si mesmo: não ia deixar o menino nas mãos de Salvatore, mas levaria para ali o sobrinho e iria protegê-lo, continuamente, da influência tóxica do avô, tal como Bruno o tinha protegido a ele.

      O avô sorriu.

      –

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