O último comboio para a liberdade. Meg Waite Clayton

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O último comboio para a liberdade - Meg Waite Clayton HARPERCOLLINS PORTUGAL

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      — Não somos… O quê?

      — Não o mostras aos teus amigos, mas mostraste-mo, portanto, pela lógica, não sou tua amiga.

      Stephan riu-se.

      — Nunca tinha conhecido alguém que conseguisse ser tão tecnicamente brilhante e estar tão absolutamente enganado. De todas as formas, não to mostrei, encontraste-o.

      — Portanto, então, somos amigos porque não mo mostraste?

      — Claro que somos amigos, idiota.

      O paradoxo da amizade. Era uma amiga e, ao mesmo tempo, não era.

      — Estes túneis vão até ao Burgtheater? — perguntou ela. — Podíamos fazer uma surpresa ao avô. Ou melhor ainda! Podemos ir ao escritório da minha mãe? É perto de St. Rupert’s e também do nosso apartamento. Os túneis chegam até lá?

      Stephan costumava percorrer os mesmos caminhos quando estava lá em baixo para não se perder, mas sabia chegar até St. Rupert’s e ao seu apartamento. Encontrara várias rotas diferentes desde que tinham acabado as aulas, embora não fosse como o médico de Amok, porque não estava a persegui-la. Poderia levá-la e dar uma volta grande, pelas criptas situadas por baixo da catedral de St. Stephen, e atravessar os três níveis do que, uma vez, tinham sido um convento. Poderia levá-la por baixo da Judenplatz, os restos de uma escola subterrânea do Talmude de há séculos. Talvez até a levasse a ver os velhos estábulos. Assustar-se-ia ao ver os crânios dos cavalos? Conhecendo Žofie, adoraria. Bom, talvez reservasse os estábulos para ele, pelo menos, por enquanto.

      — Muito bem — acedeu. — Por aqui, então.

      — Que comece o jogo! — exclamou ela.

      — Queria dizer-te que já acabei O Sinal dos Quatro — comentou. — Trago-to amanhã.

      — Mas eu não acabei o Kaleidoscope.

      — Não tens de mo devolver. Podes ficar com ele para sempre, digo. — Ao ver a reticência no seu rosto, acrescentou: — Tenho outro exemplar. — Embora não fosse verdade. Contudo, gostava de pensar que uma metade do seu conjunto de dois volumes estaria nas mãos de Žofie ou imaginá-lo na sua estante enquanto ela lia de noite. — Já tinha um exemplar quando a tia Lisl mo ofereceu no meu aniversário — mentiu. — Gostaria que ficasses com ele.

      — Não tenho um exemplar extra de O Sinal dos Quatro.

      — Vou devolver-to, prometo — troçou, entre gargalhadas.

      Passou ao lado da pilha de escombros e junto de uma escadaria de metal que subia em círculos até ao topo da passagem, onde havia uma tampa de esgoto octogonal com oito triângulos metálicos cujas pontas se tocavam no meio e que podia empurrar-se para baixo ou podia ser puxada da rua. Passaram ao lado da escada e, depois, desceram por uns degraus metálicos até chegar a uma passagem larga e abobadada, feita de blocos empilhados. Um rio corria junto de um caminho com corrimão, iluminado por uma lâmpada gradeada que pendia do teto e que projetava as suas sombras grandes contra a parede.

      — Esta parte é de quando desviaram o rio para o subsolo para expandir a cidade — explicou a Žofie, enquanto apagava a lanterna. — Também ajudou a prevenir a cólera.

      A passagem acabava de forma abrupta, mas a água seguia o seu curso através de uma arcada mais pequena, como a que havia junto do Burgtheater, e era preciso mergulhar e nadar entre a porcaria para continuar a avançar. No entanto, naquele ponto, havia umas escadas que subiam até uma passarela metálica situada por cima da água, com um rolo de corda e um colete salva-vidas pendurados no corrimão, pelo sim pelo não. Atravessaram a passarela, desceram e recuaram pelo outro lado do rio até entrar noutro túnel mais estreito e mais seco. Stephan reacendeu a lanterna e iluminou imensos escombros.

      — Este é outro sítio em que parte do túnel desabou, talvez durante a guerra, como junto do túnel pequeno que dá para a nossa cave do cacau — explicou e guiou-a através do buraco estreito que havia entre o desmoronamento e a parede do túnel. Ao passar para o outro lado, apontou com a lanterna para um portão fechado com cadeado. Mais à frente, havia uma confusão de caixões e ossos humanos que pareciam organizados por partes do corpo, para além de uma pilha cuidadosamente montada e composta apenas de crânios.

      A MAIOR MÁQUINA DE ESCREVER DO MUNDO

      Stephan estava há talvez um quarto de hora a guiar Žofie-Helene pelo subsolo quando chegaram a uma escada circular que levava a outra tampa de esgoto octogonal perto do escritório da sua mãe. Havia outra saída mais próxima, na mesma rua do seu apartamento, mas era apenas uns degraus metálicos que chegavam até um ralo que pesava demasiado para conseguirem levantá-lo. Saiu para a rua e deu-lhe a mão para a ajudar a subir, embora depois lhe custasse soltá-la. Voltou a tapar a entrada com um pontapé e seguiu-a até ao escritório do jornal da mãe dela, onde havia um homem a usar a maior máquina de escrever que alguma vez vira.

      — É um linótipo — explicou Žofie. — É automático, como as máquinas do Rube Goldberg. Compõe os textos para a tiragem do jornal.

      — É difícil de aprender? — perguntou Stephan ao tipógrafo, imaginando que conseguiria compor o texto de uma peça com aquela máquina. Para fazer cópias agora, usava papel de decalque e esmurrava as teclas com força, mas, como não podiam fazer-se muitas cópias dessa forma, tinha de escrever para elencos pequenos ou repetir o mesmo texto várias vezes. — Já sei escrever à máquina.

      — É impressionante que saibas tanto, Stephan — disse Žofie-Helene.

      — Eu sei muito?

      — Sobre o subsolo, o fabrico do chocolate, o teatro e escrever à máquina. E gostas de o dizer. Quando falo, as pessoas olham para mim como se fosse um bicho-do-mato. Mas tu és um pouco como o professor Gödel. Às vezes, também dizes que me engano em coisas.

      — Disse que te enganaste com alguma coisa?

      — Disseste que não podia comer grãos de cacau. E falaste da cave — replicou ela. — Às vezes, digo coisas erradas só para ver quem se apercebe. Quase ninguém percebe.

      No escritório da diretora, havia uma menina mais pequena do que Walter a pintar, sentada a uma secretária, enquanto uma mulher que devia ser a mãe de Žofie falava ao telefone.

      — Jojo, pintaste-me alguma coisa bonita? — perguntou Žofie, pegando na irmã ao colo e girando com ela enquanto a pequena se ria às gargalhadas. Stephan também quis dar voltas em círculos, embora não gostasse muito de dançar.

      A mãe indicou com um dedo que estava prestes a acabar a chamada, enquanto, pelo auscultador, dizia: «Sim, é evidente que o Hitler não vai achar graça, mas também não acho graça às suas tentativas de obrigar o Schuschnigg a levantar o veto ao partido nazi austríaco. E, dado que a minha opinião não vai travar as suas tentativas, tenho a certeza de que não devia permitir que nos impeça de publicar o artigo.» Acabou a chamada e pousou o auscultador. «Oh, Žofie, o teu vestido! Outra vez não.»

      — Mãe, este é o meu amigo, Stephan Neuman — apresentou-o Žofie. — Chegámos até aqui da fábrica de chocolate do pai através de…

      Stephan lançou-lhe um olhar de aviso.

      —

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