Tempo de esperança. Daphne Clair
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O seu rosto era invisível na escuridão, mas observou-o a dar um passo atrás. Soltou uma gargalhada.
Ela respirou profundamente para levar ar aos seus pulmões. Dava-lhe voltas à cabeça e parecia estar a flutuar no espaço, no escuro e confuso espaço. Teve que respirar novamente para poder falar:
– Dá-me a chave – disse e rangeu os dentes.
O homem apertou-lhe o nariz com dois dedos.
Ela tentou soltar-se, mas ele não a largou e os seus dedos roçaram-se. Quando finalmente conseguiu tirar-lhe a chave, deu meia volta e tentou encontrar a fechadura, mas tremia tanto que não era capaz de fazê-lo.
Então, o homem tirou-lhe a chave e colocou-a correctamente na fechadura. Depois, abriu a porta e colocou uma mão nas suas costas e empurrou-a suavemente para o interior da casa.
Quando fechou a porta ficaram na escuridão. Ela não via nada, mas conseguia ouvir a respiração do homem, cheirar a sua roupa de algodão e lã, o seu sabão e uma suave água de colónia masculina. Começou a cheirar um sedutor aroma a homem excitado.
Então, ele pegou-lhe pela cintura.
– Estás a tremer – murmurou, roçando a sua cara com o cabelo. – Lamento.
– Lamentas? – exclamou ela, furiosa, envergonhada e confusa.
Procurou o interruptor e ficou furiosa e pálida quando acendeu a lâmpada. Diante dela, um homem de cabelo escuro, olhos azuis, sobrancelhas escuras sobre um nariz magistral e uns lábios que não podiam esconder a sua poderosa sensualidade.
– Estás pálida.
– Estiveste a perseguir-me? – perguntou ela.
– A perseguir-te?
– Estavas a seguir-me. Não me digas que não tentavas esconder-te.
– Estava a tentar não te assustar.
Ela quase soltou uma gargalhada.
– O quê?
– Pensei que se ouvisses passos atrás de ti nestas ruas tão escuras terias razão em ficares assustada.
– Como diabo não ia assustar-me ao saber que tinha alguém a seguir-me? – exclamou ela, largando a mala na mesa do telefone.
– Ignorava que soubesses.
Ele pegou na sua mão e deu-lhe a chave. Depois, tentou dar-lhe um beijo, fazendo com que ficasse com a pulsação acelerada.
– Precisas de um copo – disse, olhando à sua volta.
– Não preciso…
Ele largou a sua mão para a levar até ao salão, a primeira porta aberta no corredor.
– Senta-te – ordenou, levando-a até ao sofá.
– Não preciso de um copo. E se precisasse eu próprio o servia.
Sem dizer nada, o homem aproximou-se da estante onde estavam as garrafas.
Sabendo que não faria caso aos seus protestos, ela deixou-se cair no sofá e esperou até que o homem voltou com um copo de uísque. Ao beber o primeiro gole, os seus olhos ficaram repletos de lágrimas, mas tentou disfarçar.
Ele sentou-se a seu lado. Tinha um braço apoiado nas costas do sofá e olhava para ela com intensidade.
– Bebe tudo.
Deveria dizer-lhe que fosse para o inferno, que não precisava de nenhum homem que a seguisse até à sua casa e que lhe dissesse o que tinha que fazer.
Levantando o copo, bebeu o resto do líquido.
– Vives aqui sozinha?
– Isso não é assunto teu – disse ela, sem pensar.
Por que é que não lhe tinha dito que tinha noivo, marido, namorado, qualquer coisa? Ou que vivia com mais três pessoas.
– Já sei.
– Desde quando me segues?
– Vi-te descer do autocarro na avenida Ponsonby. Costumas regressar a casa sozinha? – perguntou ele, com um tom de reprovação.
A avenida Ponsonby era muito popular pela sua ecléctica mistura de emigrantes, mulheres das ilhas Fiji com os seus lenços de cores, lojas de todo o tipo, locais de moda e galerias de arte. Mas, sobretudo, pelos seus cafés e restaurantes cheios de pessoas e bem iluminados. Apenas estava a trezentos metros da sua casa, mas para chegar ali devia atravessar várias ruas escuras.
– Nunca me tinha acontecido nada até hoje.
– E, hoje, também não te aconteceu nada. Eu assegurei-me disso.
– Muito obrigado, mas não era necessário – replicou ela, sarcástica.
– Quando te vi, apercebi-me que era totalmente necessário. Importas-te que me sirva de um copo?
– Sim, importo-me.
– Estás a ser um pouco grosseira, não? – sorriu ele.
Tontamente, sentiu-se reprovada. Como se aquele homem tivesse algum direito sobre ela.
– O que mereces.
– Queres um pouco mais?
Ela negou com a cabeça.
Sabia que não podia mandá-lo embora da sua casa. Mas aquela era sua casa e ele era um intruso.
– Não esperas que me vá embora, agora, não?
– E se te pedir?
Ele estava a olhar para o seu copo. O líquido não se mexia, as suas mãos estavam perfeitamente firmes. Ao contrário das suas. Todo o seu corpo tremia de forma quase perceptível.
– Estás a pedir que me vá embora?
Ela conteve a respiração.
«Diz».
– Sim.
Não o tinha dito com muita determinação, mas sim claramente, embora em voz baixa.
Passaram uns segundos. Então, ele levantou o seu copo e bebeu um gole. Depois, olhou-a fixamente nos olhos.
– Não.
Ela levantou-se de repente e teve que segurar-se no braço do sofá porque o movimento brusco deixou-a tonta. Além disso, não podia sair a correr. Ele poderia apanhá-la antes de dar dois passos.
O homem bebeu o resto do uísque e deixou o copo sobre a mesa.