Castrado. Paulo Nunes

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Castrado - Paulo Nunes

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e vômito.

      Livremente inspirado em uma história verídica.

      O dragão

      __________________

      O poeta, pintor e visionário William Blake é, sem sobra de dúvidas, um dos autores mais estranhos da literatura inglesa para os críticos. Sua pintura em aquarela do apocalipse bíblico, intitulada de O grande dragão vermelho e a mulher vestida de sol, mesmo séculos depois, desafia o imaginário popular e provoca o expectador a um mergulho em suas dualidades inconscientes. No esplendor de sua genialidade, Blake apresenta o dragão como o guardião do que considero nossos tesouros inconscientes, aqueles que são recalcados com o propósito de nos manter civilizados e pertencentes a uma cultura. O enfrentamento a esse dragão, com o intuito de se apossar desses tesouros, é o que há de mais rude na natureza humana. A luta é para que o homem se aproprie do que é seu por direito e seja livre em sua essência, inclusive para amar, da forma que desejar. É isso que vejo naquele dragão.

      Conflito, dor, sofrimento, angústia e desespero é o que deve esperar quem almeja ver o ouro dos seus infernos reluzir diante dos olhos. O contrário também é verdadeiro. Quietude, prazer, alegria, alívio e esperança são características de quem decidiu ignorar a existência dessa sala escondida e escura que existe em nós, mantendo, assim, uma vida normal e aceitável socialmente. Isso, com certeza, não se aplica à minha história. Mesmo sem armas e não tendo consciência do que fazia, em um passado não muito distante, enfrentei o dragão que detinha a chave da arca dos meus tesouros. Pensei que esse monstro habitava somente a minha fantasia e imaginação, mas, com o passar do tempo, descobri que também era real e dormia todas as noites na minha cama. Para vencê-lo, meu propósito era simples: esperar, humilhar e me vingar. Depois de destruí-lo, iria apossar-me do que é meu e recuperar a felicidade que me foi roubada brutalmente. Isso para mim significava vencer. Para a psicanálise, significa deixar o meu inconsciente gozar.

      A analogia com a arte de Blake parece propícia para este momento de vida em que me encontro ao escrever meu segundo livro, que é a continuação do que revelei no primeiro. Caso o leitor não esteja entre os trinta milhões de pessoas que já leram a primeira parte da história em todo o mundo, incentivo-o a começar esta séria literária, inicialmente com o que já foi publicado, pois será mais fácil de compreender o que exponho, ou de enojar-se. Chamo-me Gaius Barrys e, antes que o leitor se confunda porque mencionei William Blake e o seu Grande dragão vermelho e a mulher vestida de sol, permita-me confessar que depois que apreciei aquela arte apocalíptica no Museu do Brooklyn, em Nova Iorque, quase todas as noites tenho sonhado com aquele ser estranho de olhos esbugalhados. Os sonhos eram misteriosos, repetidos e, quase sempre, acontecia a mesma coisa. Neles, estava em pé, contemplando o monstro e a mulher aos seus pés. Mas, em vez da calda, via, no dragão, um grande pênis, que não parava de gozar sobre o corpo dela, manchando sua roupa dourada, transformando-a lentamente em uma cor escarlate a cada jato de sêmen. A mulher tentava se livrar dos esporros que jorravam abundantemente do pênis. Eles encharcavam seu corpo inteiro. Em um determinado momento, o dragão e a mulher olhavam para mim. Nisso, percebia que era uma criança, com três ou quatro anos, e estava sem roupa. Com os olhos da mulher fitos nos meus, surgia em mim a consciência de que ela era uma santa. A Virgem Maria, talvez? Instantaneamente, sentia uma enorme vontade de estar no lugar dela e ser banhado por aquele líquido viscoso e farto. Então, caminhava ao encontro deles desejoso daquilo. E, antes que os tocasse, despertava do sono e acordava sobressaltado. Assim eram os sonhos.

      Na noite de um desses sonhos que descrevi, em minha cama, já acordado, ainda com os olhos trêmulos, tentando aquietar a respiração ofegante, toquei meu membro e percebi que tinha gozado. No mesmo instante, olhei para ele, dormindo serenamente ao meu lado. Passeei meus olhos por aquele corpo e rosto angélicos, contemplando aqueles cabelos meio castanhos e meio loiros, e sentindo o ódio e a fúria gritarem dentro de mim. Apertei meus dentes uns contra os outros com força, respirei fundo e voltei a dormir.

      Na tarde daquele dia, sutilmente, senti que alguém estava em meu quarto. Tentei abrir os olhos para me certificar, mas o sono me possuía por completo. Virei-me para o outro lado, agarrei-me a dois travesseiros que me faziam companhia e me entreguei àquela sensação gostosa de voltar a dormir. O barulho do fechar das gavetas e do salto alto, que tocava o piso de mármore e madeira do meu quarto, irritava-me. Que inferno! Pensei. E ao decidir libertar meu corpo das cobertas e esbravejar contra quem estivesse atrapalhando meu sono, virei-me e abri meus olhos, fazendo questão de mostrar minha cara feia a quem estava lá. Era Alyce. Meus olhos a fitaram com fúria. Bufei demoradamente para externar meu incômodo ao ser acordado, enquanto ela disfarçava que ainda procurava algo nas gavetas do meu closet. Caminhando como criança que sabe que fez alguma traquinagem e foi descoberta, cheia de vergonha em seu rosto, Alyce se aproximava da minha cama e parou somente ao me ouvir comentar com a voz impaciente, enquanto eu esfregava meus olhos:

      — Não me lembro de ter pedido para que me acordasse, Alyce. Algum compromisso que esqueci?

      — Como já passa das 13h, imaginei que quisesse repassar seus compromissos para esta semana. Temos convites pendentes que você não confirmou... — falava, com a voz baixa, tentando sorrir para que minha irritação não aumentasse, quando a interrompi.

      — Não há nada que não possa esperar até o início da noite, Alyce. Sabe que não gosto que me acordem. Por que me acordou? Que inferno! — reclamei, batendo as palmas das mãos contra as cobertas, que ainda aqueciam meu corpo.

      — Desculpe. Desculpe. Sei que não gosta, mas temos assuntos para tratar, e pensei que...

      — Não pensou nada. Você me acordou para conversar sobre as suas investidas fracassadas em George. Meu Deus, Alyce! É claro que ele é gay! Que homem heterossexual e solteiro rejeitaria uma mulher linda como você? Esquece esse cara e me deixe dormir, por favor, por favor... — e fazia cara de súplica, implorando para que saísse do quarto.

      — Gaius, não é sobre o George — interrompeu-me ela, assumindo um semblante de preocupação e tristeza em seu rosto, enquanto derreava as sobrancelhas e pressionava os lábios.

      — Algum problema na entrevista com a Oprah? — questionei com tom de preocupação, percebendo que ela tinha algo importante a dizer.

      — Para a Oprah, estamos com tudo sob controle — e ficou calada, olhando-me, querendo falar, como se buscasse palavras.

      — Alyce, o que aconteceu? Algum problema com ele? Está tudo bem no México? — perguntei, imaginando que algo ruim tivesse ocorrido.

      — Não. Não é isso... — e novamente ficou calada.

      — Fale de uma vez, por favor — ordenei, ansioso e impaciente.

      — O pai de Aidan faleceu — contou ela, à queima-roupa.

      O quê? O Senhor Daan morreu? Pensei. Nisso, rapidamente, livrei meu corpo das cobertas e levantei-me, pondo-me a olhar para ela com cara de espanto, ainda tentando assimilar a informação que ouvi.

      — Como isso aconteceu? O que houve? — perguntei, caminhando em sua direção, abraçando-a.

      — Um infarto no início da manhã. A empregada percebeu que ele demorava no banho e foi ao quarto. Estava caído no box, com o chuveiro ligado. Ela chamou a equipe do resort, que o levou ao hospital. Foi inútil. Era tarde demais — respondeu, lamentando.

      — Que coisa horrível, Alyce. Onde está Aidan? — perguntei, afastando-me dela, procurando um roupão para cobrir meu corpo

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