A Ordem. Daniel Silva

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A Ordem - Daniel Silva HARPERCOLLINS PORTUGAL

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de se tornar chefe do Departamento, recuperara a pintura roubada mais procurada do mundo, a Natividade com São Francisco e São Lourenço, de Caravaggio. Tinha-se assegurado de que a Brigada de Arte recebia todo o crédito por isso. Fora por esse motivo, entre outros, que o general Ferrari aceitara providenciar a Gabriel e à sua família segurança vinte e quatro horas por dia, durante as suas férias em Veneza.

      — Era suposto estar a descansar — disse o general.

      Gabriel baixou a viseira de ampliação.

      — E estou.

      — Há algum problema?

      — Por razões inexplicáveis, estou a ter algumas dificuldades em recriar a cor da vestimenta desta mulher.

      — Refiro-me à sua segurança.

      — Parece que o meu regresso a Veneza passou despercebido.

      — Não completamente. — O general olhou de relance para o relógio de pulso. — Calculo que não consiga convencê-lo a fazer uma pausa para o almoço…

      — Nunca almoço, quando estou a trabalhar.

      — Sim, eu sei. — O general desligou os candeeiros de halogéneo. — Ainda me lembro.

      Tiepolo dera a Gabriel uma chave da igreja. Observado pelo comandante da Brigada de Arte, acionou o alarme e trancou a porta. Caminharam juntos até um café que ficava algumas portas abaixo da antiga casa de Tintoretto. O funeral papal passava na televisão atrás do balcão.

      — Caso esteja a perguntar-se — disse o general —, o arcebispo Donati queria que estivesse presente.

      — Então, porque é que não fui convidado?

      — O camerlengo não permitiu.

      — O Albanese?

      O general assentiu com a cabeça.

      — Pelos vistos, nunca se sentiu confortável com a proximidade da sua relação com o Donati. Aliás, nem com o Santo Padre.

      — Provavelmente, é melhor eu não ter ido. A minha presença só teria sido uma distração.

      O general franziu o sobrolho.

      — Deviam tê-lo sentado num lugar de honra. Afinal, se não fosse por si, o Santo Padre teria morrido no atentado terrorista no Vaticano.

      O empregado, um rapaz magricelas de vinte e poucos anos, vestido com uma t-shirt preta, serviu-lhes dois cafés. O general acrescentou açúcar ao seu, mexendo com uma mão à qual faltavam dois dedos. Perdera-os devido a uma carta armadilhada, quando era comandante da divisão de Nápoles dos carabinieri, que estava infestada pela Camorra. A explosão também lhe levara o olho direito. A prótese ocular, com a sua pupila imóvel, deixara o general com um olhar frio e inflexível. Até Gabriel tinha tendência para o evitar. Era como fitar o olho de um Deus que tudo vê.

      Naquele momento, o olho estava apontado na direção da televisão, onde a câmara se movia lentamente para mostrar uma galeria de políticos, monarcas e celebridades globais variadas. Finalmente, deteve-se em Giuseppe Saviano.

      — Pelo menos não está de braçadeira — murmurou o general.

      — Não é um admirador?

      — O Saviano é um defensor apaixonado do orçamento da Brigada de Arte. Como tal, damo-nos bastante bem.

      — Os fascistas adoram o património cultural.

      — Ele considera-se um populista, não um fascista.

      — Que alívio.

      O breve sorriso de Ferrari não se espelhou minimamente na sua prótese ocular.

      — A ascensão de um homem como o Saviano era inevitável. O nosso povo perdeu a fé, com noções fantasiosas como democracia liberal, União Europeia e aliança ocidental. E como é que não perderia? Entre a globalização e a automatização, a maioria dos jovens italianos não consegue começar uma carreira digna. Se quiserem um emprego bem remunerado, têm de ir para a Grã-Bretanha. E, se ficarem aqui… — O general olhou de soslaio para o jovem atrás do balcão. — Servem cafés aos turistas. — Baixou o tom de voz. — Ou aos espiões israelitas.

      — O Saviano não vai alterar nada disso.

      — Provavelmente, não. Mas, entretanto, vai projetando força e confiança.

      — Então, e a competência?

      — Desde que mantenha os imigrantes afastados, os seus partidários estão-se nas tintas para o facto de ele não conseguir construir uma frase.

      — E se houver uma crise? Uma verdadeira crise. Não uma inventada por um site de direita.

      — Como por exemplo?

      — Pode ser outra crise financeira que arrase o sistema bancário. — Gabriel fez uma pausa. — Ou algo muito pior.

      — O que é que poderia ser pior do que ver as poupanças da minha vida inteira esfumarem-se?

      — Que tal uma pandemia global? Uma nova estirpe de gripe para a qual os humanos não tenham uma defesa natural.

      — Uma praga?

      — Não se ria, Cesare. É só uma questão de tempo.

      — E de onde é que virá essa sua praga?

      — Vai passar de animais para humanos num local onde as condições sanitárias deixem muito a desejar. Um mercado chinês, por exemplo. Vai começar lentamente, com um conjunto de casos locais. Mas, como estamos tão interligados, vai propagar-se pelo mundo inteiro como um incêndio. Os turistas chineses vão trazer o vírus para a Europa Ocidental nas fases iniciais do surto, ainda antes de o vírus ser identificado. Em poucas semanas, metade da população italiana vai estar infetada, talvez mais. O que é que acontece nesse momento, Cesare?

      — Diga-me o Gabriel.

      — Todo o país terá de ficar em quarentena para evitar que continue a propagar-se. Os hospitais vão ficar tão saturados que vão ser forçados a rejeitar toda a gente, exceto os mais novos e saudáveis. Vão morrer centenas de pessoas todos os dias, talvez milhares. O exército terá de recorrer à cremação em massa para evitar mais contágios. Vai ser…

      — Um holocausto.

      Gabriel assentiu lentamente com a cabeça.

      — E como é que imagina que um iletrado incompetente como o Saviano vai reagir nessas circunstâncias? Vai ouvir os médicos especialistas ou vai achar que ele é que sabe? Vai dizer a verdade à população ou vai prometer que há uma vacina e um tratamento logo ao virar da esquina?

      — Vai culpar os chineses e os imigrantes e sair disso mais forte do que nunca. — Ferrari olhou seriamente para Gabriel. — Sabe alguma coisa que não me está a contar?

      — Qualquer pessoa com dois dedos de testa sabe que já há muito que devíamos ter tido algo à escala da gripe

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