Meu Irmão E Eu. Paulo Nunes
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— Vou chamá-lo, papai! Vou ao banheiro, e aproveito para chamá-lo! — gritei, tentando controlar a ansiedade da voz, depois que percebi que papai me olhava intrigado.
Ainda tinha as mãos trêmulas, quando apertei o botão 6 do elevador. Olhava para o visor e pensava: vai rápido, vai rápido. E lá estava no mesmo corredor dos belos quadros, que apreciei no início da tarde. O espelho da luxúria me lembrou da última conversa com Aidan, e como o deixei falando sozinho. Droga! Preciso que ele não diga nada a papai sobre o beijo com Pablo. Pensei. A porta da suíte estava entreaberta e, vagarosamente, empurrei-a. Vi-o em pé na sacada da suíte, descalço, apenas de bermuda, com os cabelos molhados e penteados, tendo apenas a companhia de uma garrafa de uísque e um cinzeiro que servia de descanso para o fim de mais um cigarro. Olhava concentrado para o horizonte ou para o grande bosque nos arredores do hotel, ou até mesmo para o nada. Aos primeiros passos, fui recepcionado por nocturne, de Chopin. Minha mãe adorava essa peça. Pensei. Dois abajures acesos ofereciam uma iluminação intimista ao ambiente. Alguns passos meus foram o suficiente para que minha presença fosse percebida por ele. Nisso, virou-se em minha direção. Ele tinha a mandíbula fechada, os olhos vermelhos e o semblante triste. Encarou-me direto na pupila, e deixou que os segundos de silêncio falassem o que sua boca se recusava a dizer. Não foi preciso muito tempo daquele olhar constrangedor para saber o quanto eu o tinha machucado. Mas o ápice da minha consciência se deu quando uma tímida lágrima escorreu dos seus olhos. Ele virou-se para o horizonte novamente e tentou disfarçar, enxugando-a com as costas da mão. Envergonhado, com um nó na garganta, aproximei-me lentamente e pus-me a olhar para horizonte com ele.
— Minha mãe adorava Chopin, sabia? — comentei.
Tive silêncio como resposta. Apenas os uivos dos ventos e a maciez de Chopin podiam ser ouvidos. Era embaraçoso estar ali, principalmente depois do que vi instantes antes.
— Papai perguntou por você — comentei novamente, tentando ver sua reação de soslaio.
— Por que está aqui, Gaius? — perguntou, encarando meu rosto de frente.
— É que você saiu... E papai quer que você vá vê-lo. Então, vim chamá-lo — respondi, gaguejando e sem conseguir olhá-lo direito.
— Acho que prefiro não ver seu pai hoje — comentou, com a voz suave, porém firme.
Virei-me de frente para ele e disse:
— Aidan, sinto muito pelo que aconteceu na piscina. Quero que saiba...
— Você sabe por que estou aqui, Gaius? — interrompeu-me, olhando-me nos olhos, com a voz meio exaltada.
Depois, continuou:
— Vim até aqui por você. Porque senti sua falta. Depois que foi embora de Nova Iorque, vi-me perdido, distante de quem eu amo. Nunca escondi que gostava de você. E não esconderei! O que aconteceu entre nós naqueles dias que passamos juntos foi muito forte para mim. Talvez, não tenha sido para você, mas para mim foi! Você nunca soube, mas é bom que saiba agora que foi o primeiro homem com quem fui para a cama. Não foi o único, mas foi o primeiro. Depois daqueles dias, eu quis ter uma relação, mas você sempre fugiu e me evitou, nunca atendeu ao celular ou quis me encontrar. Então, conversei com seu irmão e disse que estava apaixonado e, também, que iria conquistar você. Marcus sempre me apoiou, incentivou e aconselhou, mas você nunca me deu nenhuma chance de mostrar o quanto eu o amo e o quero fazer feliz. Nunca pensou em como eu me sentia, quando o convidava para uma vernissage ou mesmo para ir ao teatro e você inventava uma desculpa, dizendo que não podia? Nunca pensou em como eu me senti todas as vezes que chegava ao apartamento do seu irmão para ver você, e via quando se trancava no quarto até eu ir embora? Nunca passou pela sua cabeça que eu gostasse de você de verdade? Nunca considerou que o que eu sinto por você é amor? E então eu venho aqui para vê-lo, e o que encontro? Você beijando um cara que mal conhece? É isso que mereço por amar você? Que droga, Gaius! Que droga! O que é que preciso fazer para que entenda que eu amo você, droga? — e, num ato impulsivo e violento, tomou a garrafa de uísque na mão, atirou-a com força na parede, encarando-me ferozmente com aqueles olhos cor de âmbar.
Era janeiro em Nova Iorque. O frio de dezembro e a decoração de Natal desapareciam diante de nossos olhos dia após dia. Os americanos deixavam para trás as emoções das festas e retomavam novamente suas rotinas de trabalho. Tudo voltava ao normal. Ainda morava com Marcus e Núbia em Manhattan, mas já estava preocupado com o estado de saúde da minha mãe, e pensava, seriamente, em mudar para Monte Carlo. Lembro-me que no início daquela primeira semana do ano, meu irmão comentou que iria viajar na sexta-feira para Connecticut para participar de um congresso sobre serviços financeiros imobiliários e que iria aproveitar para descansar. Disse-me que ficaria na cidade uns dois ou três dias a mais depois do fim de semana. Núbia e Arthur iriam com ele.
— E vou ficar sozinho aqui? — perguntei, indignado.
— Olhe, maninho! Se quiser ir conosco, pode ir, não tem problema, mas vou passar o fim de semana inteiro no congresso. Somente na segunda é que vou poder passear. Núbia marcou de encontrar umas amigas do colegial que moram lá para passar o tempo. E na segunda é o aniversário dela. Estamos pensando em ficar um pouco sozinhos, sabe? Ela até já conseguiu para que Arthur fique na casa de uma amiga dela na segunda e na terça. Mas se você quiser ir conosco, tudo bem. Só acho que você não vai gostar.
Estava claro que meu irmão sugeriu, educadamente, que eu não fosse com eles. Que saco! Pensei. Na noite de quinta-feira, depois do jantar, despedi-me deles, visto que iriam sair antes do nascer do sol. Dei um beijo em cada um e fui dormir. Na manhã de sexta-feira aproveitei para organizar alguns livros e jogar fora os cadernos do colegial. Graças a Deus que acabou! Pensei. Eram quase 13h, quando resolvi fazer um sanduíche para almoçar: pão integral, pasta de espinafre com ricota e tomate seco. O sono me chamou, e me entreguei a ele. Eram quase 17h, quando o telefone da sala me acordou. Por que não fechei a porta do quarto, meu Deus?
— Oi. Oi, Aidan. Como vai? — disse, ainda sonolento, ao atender.
Ele comentou que tinha convites para a inauguração de uma confeitaria, no centro de Manhattan, e que passaria às 19h para nos pegar.
— Aidan, meu irmão não está aqui. Ele viajou com Núbia para Connecticut.
Perguntou-me se não queria acompanhá-lo. E, brevemente, respondi:
— Desculpe, Aidan. Fica para outro dia. Tchau — e desliguei.
Corri ao meu quarto e me atirei na cama. Voltei a dormir. Era uma melodia suave, de ritmo constante, mas insistente. O que é isso? Pensei. A campainha da porta tocava insistentemente. Não acredito. Que saco! Acordei.
— Já vai! Calma! — gritava, irritado, encaminhando-me à porta.
Era Aidan. E quando me viu, logo levantou a mão para me mostrar os doces que trouxe.
— Trouxe para você — disse ele, beijando-me o rosto e entrando no apartamento, dirigindo-se para a