Castrado. Paulo Nunes
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Depois de mais alguns instantes em silêncio, Rachel perguntou:
— Tem algum telefone aqui para eu ligar para minha filha? — e abriu um sorriso para mim, confirmando que passearia comigo.
— Tem, sim. Ligue e tome seu café. Vou tomar meu drink e me arrumar — e sorri para ela, saindo com minha taça na mão.
Caminhava para o outro cômodo, quando a ouvi perguntar, ansiosa:
— O que é isso? Por que tem tanta comida aqui? Onde vamos comprar as joias?
— Passo o dia beliscando um pouco de cada coisa. Por isso, peço um café completo. Tome seu champanhe e coma o que quiser. Alimente-se bem, pois hoje iremos às compras e não sabemos a que horas voltaremos. Vamos começar com a Tiffany. E, depois, sabe-se lá Deus o que mais — respondi, já dentro do banheiro, tirando a roupa, depois de ligar o chuveiro, aumentando o volume da voz a cada frase.
Era fim de tarde e Rachel e eu estávamos animados. Como estava quente e abafado, optamos por ir andando do hotel até a loja, e, durante todo o caminho, tive que me controlar para não parecer chato, pois ela não parou de falar por um instante sobre como aquele era um dos dias mais importantes em sua vida. O ímpeto dela era visível, e sua ansiedade era enorme. Sorria algumas vezes para ela, tentando compartilhar aquele momento único em sua vida, mas confesso que meus pensamentos eram bem diferentes do que meus lábios transmitiam. Nada agrada mais uma puta que um homem que gaste dinheiro com ela. Pensava, todas as vezes que a ouvia comentar, animadamente, que iria visitar uma das grifes de joias mais caras do mundo, e como cliente, o que a deslumbrava mais ainda. Pelo amor de Deus! É só uma loja! Pare de falar sobre isso! Repetia a mim mesmo, esforçando-me para não deixar escapar o que pensava pela minha boca. É ali, finalmente.
Ao entrarmos, um homem magro, careca e de barba aparada, recepcionou-nos com os olhos. Duas atendentes logo sorriram para nós, ao mesmo tempo em que um garçom se afastou, certamente, para buscar aquele champanhe barato que eles costumam servir para persuadirem os clientes a comprar. Rachel estava nervosa e deslumbrada por entrar na Tiffany. Considerando as poucas gafes que cometeu, posso afirmar que ela se saiu bem. Nem parecia aquela prostituta que conheci na noite anterior, vendendo seu corpo em uma vitrine por cinquenta euros. Ela observava o ambiente com os olhos brilhantes, enquanto caminhávamos despretensiosamente pelas ilhas de vidro espalhadas pelo salão da loja. Não demorou e, logo, o homem careca se aproximou de nós. Ele vestia calça, sapatos e camiseta preta, e, sobre seus ombros, repousava um paletó de veludo azul-marinho. Usava óculos quadrados com armação grafite, o que realçava seu tom de pele claro.
— Boa tarde! Sejam bem-vindos! Posso ajudá-los em algo que desejem? — perguntou, parcimoniosamente, explicando bem cada palavra, tentando ser o mais atencioso possível.
Revirei meus olhos em desagrado àquele atendimento falso. Depois de um sorrisinho forçado, dei as costas para ele, continuando observando uma ilha de colares próximo a mim. Sem resposta, o homem abriu a boca para falar novamente. Nisso, interrompi-o:
— Acho que minha amiga quer ver alguns brincos. Por que não os mostra para ela? — sugeri, ainda contemplando aqueles colares singelos, quase pedindo para que me deixassem sozinho.
— É claro. A senhora pode me acompanhar, por favor? — disse ele a Rachel — levando-a consigo.
Graças a Deus que ela saiu de perto de mim! Não suporto pessoas pobres e deslumbradas! Pensei e tentei acalmar minha irritação, observando aqueles colares tão finos e singelos. Espremia meus olhos e inclinava meu rosto a fim de vê-los melhor. A variedade era enorme, de todos os tipos, estruturas e formatos. Um deles chamou a minha atenção. Suas argolas eram minúsculas, quase imperceptíveis a olhos nus, e seu pendente tinha o formato de um ramo de oliveira, com sete folhas, três em cada lado e uma na ponta. O pendente era preso ao colar por suas pontas, o que o evidenciava ao estar sobre a pele. Que lindo! Por um instante, o passado invadiu meu presente e, logo, imaginei como aquela joia cairia bem naquele peito rígido e peludo do meu irmão. Distraído entre lembranças, ouvi uma voz. Era uma das atendentes que se aproximava e perguntava calmamente se poderia me ajudar. Respondi, pedindo para ver o colar com ramo de oliveira. Enquanto ela dava a volta para o outro lado da ilha de vidro, um garçom se aproximou. Ele carregava em sua mão duas taças de champanhe. E, antes que dissesse alguma coisa, irritando-me, antecipei-me e falei:
— Ela quer champanhe. Por favor, traga-me um pouco de água — e apontei para Rachel com os olhos e, logo, vi o garçom dar as costas para mim, indo em direção a ela, que não parava de falar com o homem careca sobre todos os brincos que tinha gostado de experimentar.
Voltei meus olhos para a atendente, e vi-a vestir uma luva preta em uma mão, abrir a vitrine e retirar cuidadosamente o colar. Foi um verdadeiro espetáculo de beleza, vê-lo sair da vitrine sobre aquele tecido, que cobria a mão da atendente. Estonteante! Estendendo-o diante de mim, ela disse:
— Não é lindo? Essa é uma bela homenagem ao ramo de oliveira, que é símbolo da paz e da abundância. O colar e o pendente são de ouro vinte e quatro quilates e tem 45,75 centímetros. Caso seja necessário, se for da vontade do Senhor, podemos ajustá-lo para que fique perfeito em seu corpo. Deseja experimentar?
— Sim, por favor — respondi.
Então, ela me conduziu para a frente de um grande espelho vertical, onde pude ver meu corpo inteiro, e, suavemente, posicionou-se atrás de mim, pedindo licença, enquanto repousava suas mãos em meu pescoço. Em instantes, aquela preciosidade reluziu sobre o blazer branco que cobria meus ombros.
— O Senhor não deseja retirar o blazer? Poderá vê-lo melhor em seu corpo — perguntou, sugerindo.
— Não é necessário — e, logo, afastei-me dela, aproximando-me do espelho, ajustando aquela joia pendida em meu pescoço, a fim de que ficasse no centro do meu peito, sobre a camiseta verde escuro que vestia.
Movendo meu corpo para a direita e esquerda, tentando vê-lo sob diferentes ângulos, perguntei a ela:
— De quem é o designer? — e fiquei meio de perfil diante do espelho, encantado com a joia.
— É de Paloma Picasso. O Senhor conhece o trabalho dela?
— Sei que assinou uma fragrância para a L’Oréal no passado. Não sabia que era designer de joias.
— Ela projeta para a Tiffany desde 1980. Essa é uma de suas peças mais belas — comentou.
Preciso ler mais sobre joias. Pensei e, logo, pedi para que ela a retirasse do meu pescoço. Em seguida, comuniquei que queria duas unidades daquele colar. O garçom se aproximou com a minha taça de água. Depois de dar o primeiro gole, ouvi o estalo de um cristal no chão. No mesmo instante, pensei que Rachel deveria ter feito algo de errado. Procurei-a com os olhos pela loja e vi-a pedindo desculpas ao homem careca por ter deixado cair a taça de champanhe no chão, sujando a calça dele. Ela se desculpava repetidamente e tentava limpá-lo com um lenço branco que havia retirado da bolsa, completamente atrapalhada. O homem, delicadamente, tentava impedi-la de tocar nele, falando que não havia motivos para que se desculpasse. Olhei aquela cena e vi minha irritação ir embora, dando lugar à enorme vontade que tive de rir. Oh, meu Deus! Sinto que os dias que passarei aqui em Amsterdã serão animados com ela. A atendente me olhou com um sorrisinho no rosto, controlando-se. Então, comentei: