Castrado. Paulo Nunes
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Aidan segurou a lagosta com as duas mãos e, com a ponta dos dedos, torceu-a vagarosamente em posições opostas, cabeça e corpo, desmembrando-os. Depois, quebrou o rabo e, em um movimento único e certeiro, enfiou seu longo dedo indicador pelo rabo da lagosta, empurrando aquela carne macia para fora da casca. Eu observava aqueles dedos ágeis e a concentração com que ele fazia aquilo e pensava que, talvez, um médico, em uma cirurgia, não conseguisse ser tão preciso quanto ele foi. Antes que eu piscasse os olhos novamente, as mãos meladas de Aidan estenderam, diante de mim, a carne da lagosta em um prato, pronta para ser comida. Recebi o prato que ele me deu e entreguei o meu vazio a ele. Observei-o fazer aquilo novamente com a pata da lagosta, desta vez, utilizando o quebrador. Aidan me deu a maior parte do crustáceo, ficando com a menor, e parecia contente com o que tinha em seu prato para comer. Esperando-o terminar para começarmos a comer juntos, contemplava seu rosto e vários pensamentos invadiam minha mente, inclusive o de se eu conseguiria concretizar o que planejei.
— Prontinho. Vamos comer — disse ele, e ergueu a taça de vinho, propondo um brinde.
— Obrigado por quebrar para mim. Nunca sei fazer isso direito. Uma vez, ela escapuliu da minha mão e caiu no chão. Desde esse dia, Marcus sempre quebrava para mim — comentei, e vi em seu rosto um semblante de preocupação aparecer.
— Vamos falar de coisas boas esta noite. Um brinde a você e a nós, por este reencontro maravilhoso. Saúde — e pressionou sua taça contra a minha, piscando um olho para mim, enquanto deixava escapar um sorrisinho de felicidade.
Enquanto jantávamos, Aidan falava sobre trabalho e a preocupação que tinha com seu pai, o Senhor Daan, que abusava do cigarro e das bebidas, mesmo já tendo passado dos sessenta anos. O que o angustiava naquele momento não eram somente os vícios do pai, mas, também, o fato de ele estar conhecendo mulheres jovens pela internet e de estar gastando, com elas, muito dinheiro em viagens e presentes. Segundo ele, o pai já o havia apresentado a uma ou duas delas. Os dois discutiram algumas vezes por causa disso, mas o Senhor Daan manteve-se inflexível na busca por alguns pequenos prazeres, mesmo na terceira idade, e enfrentou o filho, afirmando que precisava de sexo e, ainda, que se preciso fosse, pagaria para tê-lo. Aidan entendia que o pai havia se rendido à cultura dos chamados sugar daddy, e fez questão de comentar o quão vulgar aquilo lhe parecia. Narrando com reclamação as ações do pai, que considerava como descalabros, Aidan observava outras mesas, e franzia a testa, como se estivesse incomodado com alguma coisa. Percebendo que algo acontecia, perguntei a ele:
— Algum problema, Aidan?
— Acho que algumas pessoas estão nos fotografando — e virou a cabeça mais uma vez para os lados.
Nisso, olhei para trás e vi quatro ou cinco mesas de pessoas, que cochichavam entre si e olhavam para nós de soslaio. Outras, usavam seus celulares para nos fotografarem e fazerem vídeos. No fim do restaurante, três ou quatro garçons observavam nossa mesa de forma diferente. Voltei meu rosto para Aidan e perguntei:
— Por que eles estão olhando para nós?
— Acho que é por causa do seu livro e por tudo que aconteceu.
— Não sabia que tinha repercutido tanto assim... — comentava, quando fui interrompido por ele, que falou com tom de dissabor, mas sem ser grosseiro.
— Gaius, você publicou um livro há mais de dois anos expondo todos nós, inclusive a si próprio. Seu livro, até hoje, já vendeu mais de trinta milhões de cópias no mundo inteiro e, em quase todo o primeiro ano, ficou na lista dos mais vendidos do The New York Times. E não podemos esquecer toda aquela confusão há seis meses, não é? Não se deve admirar que as pessoas reconhecessem você e comentassem o que narrou naquela história e o que aconteceu depois.
Por um instante, refleti sobre o que Aidan dizia. Há meses que eu não pisava em solo norte-americano. Tinha retornado há poucos dias e não imaginava que as coisas que contei no livro tivessem ganhado aquela proporção. Pensei que a imprensa tivesse esquecido de mim. Agora entendo porque a produção da Oprah insiste tanto em uma entrevista. E confesso que estar ali, com todas aquelas pessoas falando sobre mim, incomodou-me, mas não o suficiente para me fazer parar de comer a minha lagosta com aquele delicioso creme de espinafre.
— Você quer sair daqui? — perguntou Aidan, preocupado.
— Não. De jeito nenhum. Sempre vivi em Nova Iorque, e não vou me retirar de um restaurante porque existem pessoas me fotografando. Deixe-as em paz. Daqui a pouco elas param — respondi, arrogantemente, e dei uma garfada na lagosta.
— Você enricou os tabloides norte-americanos por muitos meses, Gaius. Acabou sendo a principal notícia semanal para eles — argumentou Aidan, tentando me convencer a sair do restaurante.
— Aidan, vou continuar aqui. Não vou sair. É um livro. Já foi escrito. Não há o que fazer. Hoje, considerando tudo que aconteceu, até acho que não deveria tê-lo escrito, mas não tenho mais o que fazer.
— Só acho que é importante saber que você ganhou muita notoriedade na cidade. As pessoas falam de você, Gaius — e torceu os lábios, como se dissesse que minha reputação não era a das melhores.
— Coisas boas ou ruins? — perguntei, curioso e um pouco ansioso também.
— As pessoas falam muitas coisas — respondeu, tentando desviar o assunto, extremamente desconcertado.
Entre Aidan e eu, por causa da atenção que atraí para a mesa, surgiu um clima pesado, onde qualquer outro assunto não poderia ser conversado com naturalidade. Aidan estava muito preocupado e, ao mesmo tempo, atento. Sua vigilância fazia com que a atenção para o que tentava conversar com ele fosse diminuída. Enquanto eu procurava agir com naturalidade e ignorar aquela situação, que só crescia no The Palm, contando sobre o curso de fotografia que fazia há alguns anos, vi Aidan fechar a cara e levantar-se bruscamente, ao perceber que uma moça caminhava em direção à nossa mesa com um celular na mão. Ele se aproximou de mim, ficando ao meu lado, e assumiu quase a postura de um segurança particular. Eu permaneci sentado, repousei os talheres no prato, limpei meus lábios com o guardanapo e dei um gole no vinho. Instantes depois, a moça, sorridente, pediu licença, desejou-nos boa-noite e perguntou se poderia tirar uma foto comigo. Meu espírito relaxou ao ouvir seu pedido. Graças a Deus! Pensei. Sorrindo para ela, respondi que sim. Tiramos uma foto e ela comentou que havia adorado o livro. Agradeci-a pelo comentário, e ela nos deixou, ainda sorrindo, feliz por ter uma foto minha. Olhei para Aidan e comentei:
— Ela só queria uma foto. Está tudo bem. Relaxe — e fiz sinal para ele se sentar novamente.
Ele ficou mais calmo, mas se manteve atento durante as duas horas a mais que permanecemos lá. Depois de saborear um delicioso Cronut, que é o resultado da massa folheada do Croissant com a cobertura crocante mais o glacê do Donut, comentei que queria retornar ao hotel, sugerindo que ele me levasse até lá. Aidan, prontamente, chamou o garçom, pagou a conta em dinheiro, deixando o troco como gorjeta generosa para ele e escoltou-me, enquanto eu caminhava para a saída do The Palm, apreciando a decoração do ambiente com aqueles diversos rostos de pessoas estampados em suas paredes. Ele parecia aliviado de estar saindo dali. Tive a certeza disso ao ouvir de sua própria boca já do lado de fora do restaurante:
— Que bom que não aconteceu nada. Importa-se se eu fumar um cigarro antes de pegarmos um táxi? — perguntou, respirando relaxadamente, tentando sorrir.
— Tenho cigarro aqui. Por que estava preocupado? — questionei.